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Novembro Negro: quem mantém viva a luta de Zumbi nos quilombos?

Para quilombolas e ativistas da Conaq, a luta por liberdade e inclusão segue permanente nos diversos  quilombos espalhados pelo Brasil: "são muitos Zumbis"

Ilustração: Vinícius Araújo/Alma Preta Jornalismo

Foto: Ilustração: Vinícius Araújo/Alma Preta Jornalismo

14 de novembro de 2022

“Zumbi hoje, para mim, são as lideranças da Conaq [Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas], que estão na linha de frente no enfrentamento às violações de direitos, consequências do racismo estrutural existente no país”, destaca Célia Pinto, do quilombo Acre/Santa Maria – Cururupu (MA).

A quilombola explica que ninguém melhor para representar a figura de Zumbi do que os articuladores, “pessoas que abdicam de suas vidas, de suas famílias, correndo riscos de vida e ameaças para dar voz e visibilidade a esta população historicamente marginalizada. O que temos hoje de políticas públicas para os quilombos e quilombolas são resultados da incidência destas pessoas”, avalia Célia.

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Para a população negra, o mês de novembro é um período de conscientização a respeito da liberdade conquistada pela luta abolicionista, em especial, pelo símbolo de liberdade imortalizado por Zumbi dos Palmares na época do Brasil colonial. Por mais que a educação convencional transmita de geração em geração a benevolência da coroa portuguesa, mais do que o 13 de Maio, o 20 de Novembro representa o crescimento de um movimento que anseia e ansiava igualdade, cuja força não podia mais ser contida na época, de acordo com a história nacional.

Entre as formas de resistência, estavam grandes embates parlamentares, manifestações artísticas, até revoltas e fugas massivas de escravizados, que a polícia e o Exército não conseguiam – e, a partir de certo ponto, não queriam – reprimir. Nomes como Luís Gama, André Rebouças, Adelina, Francisco José do Nascimento, Maria Firmina e tantos outros ainda têm suas histórias frescas no imaginário popular. 

No entanto, as sementes plantadas por Zumbi dos Palmares germinam até hoje, e de acordo com diversos integrantes das comunidades quilombolas do Brasil, a luta dos quilombos ainda não terminou, mas têm seus próprios Zumbis contemporâneos com o mesmo objetivo: a liberdade, inclusão e direitos.

Quem é o Zumbi desta geração?

Para o quilombo de Ribeirão Grande – Terra Seca (SP), Anésio Ribeiro é o que mais representa a figura de Zumbi. À frente da luta pelo território por décadas, hoje em dia, o quilombola está afastado das questões políticas e sociais devido à frágil condição de saúde, mas será homenageado pela comunidade de Ribeirão Grande no próximo 20 de novembro por sua dedicação por tantos anos. 

Já a comunidade da Caçandoca, localizada em Ubatuba – litoral norte de São Paulo – considera a saudosa Izaltina Maria dos Santos Prado a figura que melhor representa a luta de Zumbi. De acordo com Jurandir Cesário do Prado, membro do Fórum de Comunidades Tradicionais da região, Dona Izaltina, bisneta de escravizados, nasceu na região do Saco da Raposa, mas foi desapropriada de sua terra natal pela exploração imobiliária sofrida pelos quilombos.

  Izaltina Caçandoca

Dona Izaltina, quilombola da comunidade da Caçandoca | Créditos: Salete Santos

“Assim como toda mulher vítima do patriarcado, ela exerceu múltiplas funções, incluindo ter muitos filhos, mas nunca perdendo a esperança do retorno ao seu lugar de origem”, conta Jurandir. Ele relembra que ao retornar ao quilombo, Dona Izaltina lutou duramente por toda sua vida para ter o direito à terra herdada por seus antepassados. 

“Ela sofreu ameaças, agressões, humilhações, mas venceu a batalha contra os grileiros que usurparam o território”, conta Jurandir. Depois de anos, Izaltina não precisou mais lutar, mas passou o legado para seus filhos, segundo ele. 

“Izaltina e o marido foram mortos pelo negacionismo fascista bolsonarista, ao negar o direito de imunização contra o Covid-19. E desse luto se fez a minha luta”, emociona-se o quilombola.

Outro nome, este destacado por Jhonny Martins, membro da comunidade quilombola de Furnas do Dionísio (MS) é Ivo Fonseca da Silva. “Além de fundador da Conaq, Ivo vem contribuindo há mais de 30 anos para a luta do povo dos quilombos”, salienta. 

“A luta é feita por muitas pessoas”

De acordo com Ronaldo dos Santos, da comunidade quilombola Campinho da Independência (RJ), várias personalidades merecem homenagem em novembro. “A luta é feita por muitas pessoas, mas eu gostaria de falar sobre um nome, do Rio de Janeiro, que é a deputada federal Benedita da Silva”. 

Para ele, a parlamentar carrega em si a potência e a sabedoria negra da “irmã mais velha”, o que faz Benedita ser mais que um símbolo, e sim, uma importante referência na luta pelo direito das pessoas negras, sejam elas quilombolas ou não. 

“Nós, negros, precisamos constituir nossos símbolos, nossas referências, e zelar por isso. E Benedita da Silva, em toda a sua trajetória de mulher preta favelada, garantiu conquistas importantes para o povo negro. Benedita foi a governadora em exercício que emitiu o primeiro título de comunidade quilombola no estado do Rio, que é a minha comunidade”, enfatiza. 

Geilsa da Paixão, coordenadora da Conaq na Paraíba, destaca que hoje o Brasil convive com um grupo de Zumbis, engajados na luta pela resistência dos quilombos, como os articuladores Sandra Maria, Arilson Ventura e Givânia Silva.

“São muitos Zumbis que foram sendo construídos através do tempo para que essa fé e esperança vivam em todos nós, quilombolas. São pessoas que resistem, e por meio dessa superação, fortalecem o grupo de quilombolas com a confiança que tanto buscamos”, finaliza. 

Leia também: ‘Novembro Negro: conheça a trajetória de Zumbi dos Palmares’

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