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Homem negro considerado suspeito por usar “blusão” é inocentado

Ramon Gomes da Silva estava na zona periférica do município de Petrolina (PE) quando foi abordado; segundo os agentes, a vestimenta poderia ajudar a encobrir uma arma de fogo

Ilustração mostra homem negro retinto usando "blusão" na cor preta com a inserção de um letreiro com o questionamento "suspeito?"

Foto: Ilustração: I'sis Almeida / Alma Preta Jornalismo

20 de maio de 2022

Em Petrolina, a 713 quilômetros do Recife, um homem negro foi considerado suspeito por agentes policiais por estar usando um “blusão “passível de encobrir algum tipo de arma”. De acordo com os autos apresentados na justiça, Ramon Gomes da Silva estava na praça Dom Malan, no bairro José e Maria, zona periférica da cidade, quando a Polícia Militar de Pernambuco (PM-PE) realizava uma busca intitulada “Operação Zodíaco”, em dezembro de 2020.

Na última semana, em resposta à denúncia, o Tribunal de Justiça de Pernambuco não acatou a motivação e considerou “alegação vaga de atitude suspeita”. Em relato policial, levado pelo Ministério Público que colheu as informações de denúncia, Ramon, na ocasião, havia adquirido um celular com valor desproporcional ao de mercado, o que dava para presumir ser fruto de roubo ou furto. Segundo a versão, Ramon portava um aparelho celular marca Motorola, modelo Moto G5, cor dourada, identificado por meio dos sistemas Infopol e portal da Secretaria de Defesa Social com restrição de roubo. 

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Em interrogatório, em sede policial, o homem denunciado alegou ter adquirido o aparelho com uma pessoa chamada Tiago, que havia feito a venda sem nota fiscal ou acessórios, pela quantia de R$300. Ramon afirmou, ainda, que não tinha conhecimento que era produto proveniente de roubo ou furto. Nesse caso, ele poderia ser acusado por “receptação culposa”, de acordo com a justiça.

Segundo a defesa, o homem estaria sofrendo ameaça de prisão, o que resultou em um pedido de Habeas Corpus, ferramenta constitucional para garantir a resposta do processo em liberdade. O argumento utilizado foi de que a busca seria do tipo “pessoal”, ou seja, quando não há elementos suspeitos suficientes para uma abordagem policial.

Na última semana, o Tribunal de Justiça de Pernambuco, na responsabilidade do juiz Paulo de Tarso Duarte Menezes, acatou o recurso da defesa e negou a versão levada pelo Ministério Público com base nas informações denunciadas pela PM-PE. Para o juiz, o processo apresentou ausência de suspeita fundada e insuficiência de provas, resultando em uma alegação vaga (com base na vestimenta) para configurar uma atitude suspeita. 

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“Qual seria a atitude suspeita da pessoa denunciada, que ensejou a diligência de busca pessoal? Pode-se imaginar que não fosse pelo fenótipo social do denunciado, poder-se-ia esperar a abordagem com tamanha profundidade de detalhamento? Ou é usual isso ocorrer em todas as áreas urbanas desta cidade?”, questionou o magistrado, durante o processo. 

Como conclusão, o juiz acatou o pedido da defesa em evitar a repetição de práticas que reproduzem preconceitos estruturais arraigados na sociedade, como é o caso do “perfilamento racial”. O magistrado concordou que a ação foi “reflexo direto do racismo estrutural”. 

Como complemento, o magistrado reiterou que o caso trata-se de um padrão consideravelmente antigo e que, ao menos entre os estudiosos da polícia, não existe mais dúvida de que o racismo é reproduzido e reforçado através da maior vigilância policial a que é submetida a população negra. Por fim, após estas considerações, o caso foi arquivado.  

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