O governo da África do Sul declarou nesta segunda-feira (12) que os africânderes reassentados nos Estados Unidos não enfrentaram qualquer forma de perseguição no país. A afirmação foi feita após a partida de um grupo de 49 sul-africanos brancos, que deixaram o aeroporto de Joanesburgo no domingo em um voo fretado rumo aos EUA.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores sul-africano, a concessão de status de refugiado pelo governo estadunidense não se sustenta em fatos. O presidente Donald Trump justificou a medida alegando “discriminação racial injusta” contra africânderes. As autoridades sul-africanas rejeitam essa narrativa.
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“Não há qualquer forma de perseguição”, diz governo
O ministro das Relações Exteriores, Ronald Lamola, afirmou que as alegações de perseguição carecem de provas. “Eles não podem apresentar nenhuma evidência porque não há qualquer forma de perseguição a sul-africanos brancos ou africânderes”, declarou em coletiva à imprensa.
O governo também condenou a reprodução da ideia de “genocídio branco”, que associa o aumento da violência no país à perseguição sistemática de brancos. “O crime que temos na África do Sul afeta todos, independentemente de raça e gênero”, disse Lamola.
Para o governo sul-africano, a decisão dos EUA tem natureza política e está inserida em um contexto de tensão bilateral.
De acordo com diretrizes publicadas pela embaixada dos EUA na África do Sul, os candidatos ao programa devem pertencer a minorias raciais no país e “articular uma experiência passada ou receio de perseguição futura”.
A decisão ocorre em meio a crescentes tensões entre Pretória e Washington, agravadas por questões como a relação da África do Sul com a China, a adesão ao bloco BRICS e o processo movido por Pretória contra Israel na Corte Internacional de Justiça, no qual acusa o país de práticas genocidas em Gaza.
A proposta de reassentamento causou perplexidade entre pesquisadores e figuras públicas. Loren Landau, especialista em migração da Universidade de Witwatersrand, afirmou que, embora o racismo exista, não há evidências de perseguição sistemática a brancos no país.
“Pelo contrário, estrangeiros, especialmente de origem somali, paquistanesa e zimbabuana, são alvos frequentes de hostilidade”, disse a pesquisadora.
“Além do absurdo”, diz escritor africânder
O jornalista e escritor Max du Preez, uma das vozes mais proeminentes da comunidade africânder, considerou o reassentamento “além do absurdo”. Para ele, a medida está mais ligada à política interna dos Estados Unidos do que à realidade sul-africana.
“Isso é sobre Trump e o MAGA (em português: Torne a América Grande Novamente), não sobre nós. É sobre o ódio deles por políticas de diversidade”, afirmou du Preez, referindo-se à hostilidade do ex-presidente contra programas de inclusão racial.
O escritor também apontou que muitos dos que partiram podem ter sido motivados por interesses econômicos ou pela recusa em viver em uma sociedade pós-apartheid. “Provavelmente não queriam viver em um país onde os brancos não mandam mais”, disse.
Brancos representam 7,3% da população da África do Sul. Em média, essa parcela da população ainda possui padrão de vida superior ao da maioria negra. Estatísticas apontam que brancos detêm cerca de dois terços das terras agrícolas e têm renda média três vezes maior do que a da população negra.
Governos liderados por africânderes foram os responsáveis pela institucionalização do apartheid, sistema de segregação racial que vigorou até 1994. Desde o fim do regime, políticas de ação afirmativa vêm sendo implementadas para tentar reduzir as desigualdades históricas.