Profissionais contam como é a rotina para alertar sobre o vírus e a importância do isolamento social
Texto / Juca Guimarães I Edição / Simone Freire I Imagem / Fernando Frazão / Agência Brasil
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Nas periferias de São Paulo (SP), os agentes comunitários de saúde (ACS) estão na linha de frente da luta contra a proliferação em massa do Covid-19, o novo coronavírus. Responsáveis pela orientação sobre cuidados com a saúde, eles visitam regularmente milhares de casas em toda a cidade, e nas regiões mais social e economicamente vulneráveis.
Ao todo, são oito mil agentes comunitários de saúde, que tiveram a rotina de trabalho alterada desde o início da pandemia e o primeiro caso de infecção no Brasil, confirmado em 26 de fevereiro.
Uma agente comunitária que atua na região do Jaraguá, região Norte, e que preferiu não se identificar devido à confidencialidade que o cargo precede, informou que a orientação que mais tem dado é para que as pessoas fiquem em casa e só saiam para a rua em caso de extrema necessidade.
As famílias das periferias da região Norte, segundo ela, também fazem muitas perguntas sobre como está o funcionamento dos equipamentos de saúde e se as consultas marcadas anteriormente continuam confirmadas. “Eles também perguntam muito se já teve algum caso na região, se morreu alguém e se os postos de saúde estão abertos”, diz. “Quando a gente chega, as pessoas pedem muita informação. Elas querem mostrar vídeos e mensagens que recebem pelo WhatsApp para saber se é verdade ou não [o que estão recebendo]”, completa.
A rotina tem mudado. No começo da quarentena, os e as agentes de saúde receberam a orientação, por escrito, do sindicato para que não entrassem nas casas e realizassem o contato com as famílias somente na porta de cada residência.
No Jaraguá, luvas e máscaras para trabalhar na rua foram destinados aos profissionais. “Mas a gente nunca sabe se a pessoa com que a gente vai falar tem ou não o vírus. Então o nosso trabalho acaba sendo bastante arriscado”, diz.
Em Ermelino Matarazzo, na Zona Leste, uma outra agente comunitária, que também preferiu não se identificar, conta que está trabalhando das 8h às 17h, normalmente, mas que a rotina diária mudou. Por lá, cada agente atende uma microrregião com cerca de 300 casas. “São cerca de 750 pessoas. Antes das 10h, as pessoas não abrem a porta. Então ficam uns 30 agentes numa praça esperando dar a hora para cada um seguir o seu caminho”, explica. Antes da pandemia, os agentes ficavam reunidos em uma sala dentro da UBS. Na praça, ao ar livre, eles mantém a distância de um metro um do outro.
Ela também conta que está orientando as famílias para não deixarem os idosos saírem de casa para evitar o contágio e também a transmissão do vírus. “Até o pronunciamento do presidente [que minimizou os riscos] as pessoas estavam levando mais a sério. Depois que ele falou, vejo mais gente nas ruas. Piorou nosso trabalho!. Sentimos que estamos enxugando gelo”, ressalta.
A gente também conta que os profissionais estão receosos com a própria saúde. “Temos medo quando entramos na UBS para bater o ponto ou para algum trabalho administrativo, pois é lá que as pessoas com suspeita estão indo procurar ajuda. E lá não tem estrutura”, disse.
Para trabalhar nas ruas da Zona Leste, a agente afirma que falta material. “Na sexta-feira [27/3], recebemos um pote de álcool gel e uma máscara que tem sua durabilidade de 2 horas. É insuficiente”, disse.
No Jaraguá, a agente de saúde disse que as máscaras que os profissionais receberam nas semanas anteriores eram de qualidade ruim. “Eram aquelas simples, de amarrar atrás. Elas viviam caindo. Só ontem [31/3] é que chegou um modelo melhor com mais proteção”, disse.
Tanto na Zona Norte quanto na Leste, as agentes relataram que ainda não tem kits de teste para detectar o vírus. “E nem tem previsão de chegar”, disse a agente de Ermelino Matarazzo.
A agente do Jaraguá contou que alguns colegas de trabalho pediram afastamento por motivo de saúde. “Nenhum é caso confirmado de coronavírus, mas eles estão com os sintomas”, disse.
Outras agentes comunitárias de saúde, de outras regiões da cidade, também foram contatadas pela reportagem. No entanto, a maioria delas não aceitou dar entrevistas com receio de que a exposição pública ocasionasse em demissão diante da situação do país.
O Alma Preta também entrou em contato com o Ministério da Saúde e com a Secretaria Municipal de Saúde questionando sobre a falta de testes e quais estão sendo as medidas adotadas para resguardar o trabalho das agentes comunitárias de saúde. Ambos os órgãos não responderam até a conclusão desta reportagem.