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Jovens negros têm ‘uberização’ do trabalho como uma das poucas alternativas ao desemprego

Herança da escravidão e recentes reformas como a trabalhista ajudam a explicar precarização do trabalho no Brasil e seus efeitos, sobretudo, na população negra

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões I Imagem: Joa Souza/Getty Images

Imagem mostra entregador negro em bicicleta nas ruas de Salvador; trabalho precário é alternativa ao desemprego

30 de abril de 2021

O total de brasileiros desempregados e de pessoas que trabalham por conta soma 38,1 milhões de brasileiros, cerca de 20% da população do país. Para os jovens negros, ingressar no mercado de trabalho formal é um sonho cada vez mais distante, sobrando a realidade da precarização da mão de obra.

A “uberização” é uma das modalidades de trabalho, que surgiu nos últimos anos e consiste no trabalho em plataformas que fazem a intermediação dos serviços, sem garantias, sobretudo para a população negra. Em motocicletas ou em bicicletas, jovens que precisam de renda aceitam condições desiguais impostas pelas empresas.

“Dá uma sensação de desamparo. Demorou quase dois meses para eu ser aprovado. Eu tive que pagar R$ 50, na época pela bag [mochila térmica]. Eles estimulam que você trabalhe o máximo de horas por dia, mas sem nenhuma preocupação com o bem-estar do trabalhador”, diz Juliano Silva. O trabalhador de 30 anos começou a fazer entregas em agosto de 2019 na região central de São Paulo.

Segundo a Pesquisa do Perfil dos Entregadores Ciclistas de Aplicativo, elaborada pela Aliança Bike, a média salarial da categoria é de R$ 963 por mês e pelo menos 14h de trabalho por dia. Do total, 71% dos trabalhadores são negros.

Herança escravocrata

A precarização do trabalho cresceu acompanhada do desemprego e de reformas como a trabalhista e a da Previdência, ambas aprovadas e implementadas nos últimos cinco anos. No caso da população negra, especialistas lembram que a precariedade das condições de trabalho é uma das heranças da escravidão.

“Não por coincidência, historicamente, a mão de obra negra passou a ser considerada não qualificada quando o trabalho no país passou a ser livre e assalariado. Isso gera efeitos até hoje nas formas contemporâneas de discriminação no mercado de trabalho”, explica Daniel Teixeira, diretor executivo do Ceert (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), entidade que atua na área de garantia de direitos e igualdade racial.

A falta de políticas de reparação após a abolição do período escravocrata abriu caminho para uma escalada de precarização das relações de trabalho, segundo Vera Lúcia, ex-candidata à Prefeitura de São Paulo pelo PSTU.

“Nós negros somos os primeiros a entrar e os últimos a sair do mercado de trabalho. Muitas vezes trabalhamos na informalidade, que não conta para a aposentadoria, e a expectativa de vida é menor do que a dos brancos”, pondera Vera.

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Reflexo da pandemia

No início da pandemia, em março de 2020, a taxa de desemprego estava em 11,6%, o que já era considerada alta. Quase um ano depois, no trimestre encerrado em fevereiro de 2021, o índice de brasileiros desempregados subiu para 14,4%.

“A pressão que as altas taxas de desemprego exercem sobre a população negra é maior. Ela empurra muito mais esses trabalhadores para a informalidade e para a precarização nas relações de trabalho”, analisa o diretor executivo do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades.

Os dados de desempregados (14,4 milhões), trabalhadores por conta própria (23,7 milhões) e da diminuição de postos de trabalho com carteira assinada (8,7 milhões) são da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), divulgada nesta sexta-feira (30), véspera do feriado do Dia do Trabalhador.

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