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Maria Firmina dos Reis, a mulher que virou a igreja católica e a filosofia ocidental de ponta cabeça

7 de novembro de 2018

Primeira romancista brasileira, Maria Firmina foi homenageada na abertura da 7° edição da Festa Literária das Periferias (FLUP)

Texto / Pedro Borges
Imagem / Divulgação

Maria Firmina dos Reis virou a filosofia ocidental de ponta cabeça e se apropriou do discurso da igreja católica para lutar pelo fim da escravidão, segundo Eduardo de Assis Duarte, pesquisador da literatura afro-brasileira e um dos maiores especialistas na obra da autora.

A afirmação foi feita durante a mesa de abertura da 7° Edição da FLUP, que homenageia Martinho da Vila e a escritora, a primeira pessoa a produzir um romance no Brasil, nomeado de “Úrsula” e publicado em 1859. Também participaram da cerimônia a professora da UFRJ Giovana Xavier, a escritora Jarid Arraes e a criadora do acervo digital sobre Maria Firmina, Luciana Diogo.

A Biblioteca do Parque Estadual, localizada no Cais do Valongo, patrimônio histórico da humanidade e local responsável por receber a maior quantidade de pessoas escravizadas no Brasil, sedia a edição do evento deste ano. A atividade do dia 6 de Novembro teve início às 19h, e contou com a lotação do auditório. A organização calcula em 700 pessoas presentes.

A primeira a falar sobre a escritora ao público foi Giovana Xavier, que propôs um exercício com uma folha de papel, que representaria o silenciamento do povo negro. Para ela, a edição da FLUP deste ano é uma reparação histórica com a trajetória afrodescendente no país e dá visibilidade para uma verdade omitida.

“É uma espécie de roubo da nossa história não ser sabido por toda população brasileira, não só negros, mas toda população branca, que a primeira pessoa que escreveu um romance no Brasil foi uma mulher negra. Todos nós perdemos com isso”.

Luciana Diogo contou ao público sobre a experiência da construção do portal em memória à escritora. Para ela, Maria Firmina foi vítima do silenciamento sofrido em sociedades racistas e machistas por mulheres negras. A pesquisadora acredita, contudo, que o momento em que vivemos, de fortalecimento do debate sobre raça e gênero no país, e a homenagem da FLUP, podem alavancar o nome da escritora.

“Acho que a visibilidade à Firmina é importante e vai ajudar a dar mais holofote para ela daqui para frente, já que ela está nos vestibulares, ganhando os jornais. Eu acho que a FLUP está contribuindo muito para isso neste ano”.

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Luciana Diogo durante a abertura da FLUP de 2018 (Foto: Divulgação)

A escritora de cordéis Jarid Arraes contou sobre a importância de ter tido um pai e avô poetas, que serviram como referências dentro de casa, mas destacou a ausência de mulheres negras durante a formação que teve como escritora.

“A Maria Firmina serve como uma expoente, porque eu precisei de referências que me dissessem e assegurassem que escrever era para mim também. Mulheres como a Maria Firmina, como a Conceição Evaristo têm esse papel, de transformar a nossa autoestima e identidade”.

O pesquisador Eduardo de Assis Duarte encerrou as apresentações e exaltou o ineditismo e a potência de Maria Firmina dos Reis. Mesmo sem poder cravar, porque a pesquisa sobre a autora ainda está em andamento, ele acredita que Maria Firmina dos Reis seja a primeira mulher negra a escrever um romance em toda a América Latina.

O ineditismo da autora também está no fato de ter, já naquele momento histórico, questionado importantes nomes da filosofia ocidental e mesmo a igreja católica.

“O interesse pela obra dela se dá pelo caráter pioneiro de contestar esse pensamento europeu hegemônico, que era o pensamento colonial escravista, contestar os grandes mestres da filosofia, que justificaram a escravidão. Ela se apropria do discurso cristão para questionar o escravismo. Ela encosta a igreja católica na parede. É uma coisa muito firme e eu diria revolucionária, porque bate com o senso comum da época, e abraça a grande bandeira humanista do século XIX, que foi o fim da escravidão”.

Abertura

A cerimônia de inauguração da 7° edição da FLUP foi apresentada por Márcio Januário, escritor e ator, responsável por chamar todos os convidados ao centro do palco. Os idealizadores do evento, Écio Salles e Julio Ludemir, deram as boas vindas a todos presentes com uma breve colocação. Querem que a própria atividade mande o recado da FLUP.

“Não vou falar, deixarei o evento falar por nós”, contou Écio.

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Balões enviados para o céu com poesias de Maria Firmina dos Reis (Foto: Divulgação)

Antonio Grassi, artista e ex-secretário de cultura do Estado do Rio de Janeiro, também esteve presente, exaltou a FLUP e confessou temer pela continuidade do investimento em cultura com a entrada de novas gestões a nível estadual no Rio de Janeiro e federal no país.

“A cultura é a única ferramenta para resistir a um tempo maluco”, afirmou.

Antes do início do evento, foram enviados para o céu cerca de mil balões com trechos de poesias de Maria Firmina dos Reis. A ideia é popularizar o acesso à poesia e à obra da autora.

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