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Negras movimentam R$ 704 bilhões por ano: o que isso nos diz sobre a desigualdade?

7 de outubro de 2019

A economista Gabriela Mendes Chaves discute dados trazidos pelo jornal Folha de S.Paulo neste domingo (6) sobre o impacto das mulheres negras na economia brasileira e como isso mostra as desigualdades sociais no país

Neste último domingo (06/10), o jornal Folha de São Paulo produziu uma reportagem com a seguinte manchete: “Negras movimentam R$ 704 bi por ano, mas são escanteadas pela publicidade”.

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A matéria traz dados importantes, levantados pelo Instituto Locomotiva, que apuram o montante de 704 bilhões movimentados pelas mulheres negras no ano passado. Isso representa 16% do PIB nacional.

De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), do IBGE, as mulheres negras representam cerca de 60 milhões de pessoas. Elas são o maior grupo dentro de um cruzamento de raça e gênero, seguida dos homens negros, mulheres brancas e homens brancos.

Ainda que a discussão sobre representatividade no ramo da publicidade seja de muita importância em um país como o Brasil, a disposição dos dados na reportagem pode nos levar a uma falsa interpretação do fenômeno.

O primeiro ponto de atenção a ser observado é compreender o que significam 704 bilhões de reais numa economia como a do Brasil. Esse número impressiona, mas quando realizamos uma conta simples de renda per capta, o resultado não é o mesmo, pois estamos falando de uma renda per capta de menos de 12 mil reais anuais.

Como 28,6% da população é responsável por apenas 16% do PIB? Temos motivos para comemorar essa estatística?

Esses dados apontam para uma discussão muito séria sobre desigualdade no Brasil. É evidente, neste sentido, que a falta de representatividade na publicidade tem raízes em dimensões econômicas muito bem fundamentadas.

Comemorar os 704 bilhões pode ser bastante sedutor, mas é preciso questionar a concentração de renda presente nos outros 6 trilhões de reais movimentados pela economia brasileira.

O Brasil é um país campeão em desigualdade. Segundo números da Pesquisa de Orçamento familiar 2017-2018, 2,7% das famílias brasileiras concentram 19,9% da renda nacional. O Relatório de Desigualdade Global, por sua vez, defende que 1% da população mais rica do país concentra 28,3% da renda nacional.

Realizar o debate sobre a inserção econômica das mulheres negras via consumo, ainda que sedutor, pode ser uma grande cilada do ponto de vista financeiro.

Devemos recuperar o debate sob o eixo da produção e questionar os fundamentos da desigualdade no país. De outra forma, estamos fadadas a aceitar um sistema que se alimenta de desigualdades.

Gabriela Mendes Chaves é economista e mestranda em Economia Política Mundial pela UFABC. Também é fundadora da NoFront – Empoderamento Financeiro, plataforma de educação financeira voltada à comunidade negra. Gabriela realiza pesquisas nas áreas de economia política, trabalho, gênero, questões raciais e políticas públicas.

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