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Pessoas que vivem com HIV em Belém enfrentam precarização de serviço de saúde

Casa Dia, único espaço público destinado ao tratamento do HIV na capital paraense, acumula problemas; população negra, periférica e quilombola é a mais afetada
Fachada da Casa Dia, em Belém (PA).

Foto: Joyce Ferreira/Agência Belém

2 de outubro de 2023

Belém é a terceira capital brasileira com o maior número de pessoas com o vírus do HIV, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Aproximadamente 14 mil pessoas que vivem com o vírus estão cadastradas no sistema da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) e dependem diretamente dos serviços do Casa Dia, que acumula reclamações por problemas como a falta de acesso à consultas médicas.

O Casa Dia é responsável pelo atendimento de pacientes que são diagnosticados na rede municipal de saúde (Atenção Básica) e no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) Belém. Se o resultado é positivo, o usuário é encaminhado e matriculado automaticamente no espaço.

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“Preciso ir à Casa Dia praticamente todo mês para pegar medicação, marcar consultas e fazer exames de rotina. Sabemos que eles oferecem um serviço imprescindível para pessoas sem condições de pagar um plano de saúde como eu, mas a realidade é triste”, conta o estudante J.S., de 25 anos, que preferiu não se identificar.

“Além do receio que todos temos de encontrar conhecidos e sermos expostos ao preconceito, enfrentamos longas filas, calor e demora para conseguir um médico, sem falar da dificuldade de deslocamento, já que está localizado em um ponto não tão acessível da cidade. No meu caso, preciso pegar dois ônibus para ir e outros dois para voltar para casa. Uma situação que ainda é mais crítica para pessoas que têm complicações em decorrência do HIV ou que precisam de um acompanhamento mais frequente por causa de outras ISTs [infecções sexualmente transmissíveis]”, completa o usuário do sistema.

A Alma Preta apurou que as condições da Casa Dia só pioraram nos últimos meses. O local foi alvo de furtos três vezes em um período de apenas 45 dias. O último ocorreu na madrugada da segunda-feira (25). Diante da situação, movimentos sociais se reuniram na quinta-feira (28) para protestar por manutenção e segurança do espaço.

Negros, pobres e quilombolas são os mais afetados

A ativista Amélia Garcia, coordenadora do Fórum Paraense de ONGs Aids e integrante do Movimento Nacional de Cidadãs Positivas, Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids Pará e Comitê Arte Pela Vida, as maiores vítimas da precarização do sistema que atende pessoas com HIV em Belém são pretos, pobres e quilombolas, os maiores usuários do serviço.

“A grande maioria da população vivendo com HIV está nos bairros mais periféricos e são pessoas negras e oriundas de quilombos. São esses os rostos que você vê quando chega na Casa Dia hoje. A classe mais vulnerável ao HIV não é gente branca e rica, porque aquele que tem dinheiro faz suas consultas via plano de saúde ou consultório particular. Melhorar a Casa Dia, portanto, é trazer qualidade de vida para o público mais vulnerável”, destaca Amélia.

Segundo a ativista, a Prefeitura de Belém recebeu uma comissão formada por usuários do serviço e movimentos sociais em junho, depois que a Casa Dia foi assaltada pela segunda vez e teve computadores, notebooks e data shows levados. Entre as principais demandas apresentadas à gestão municipal estão a contratação de mais médicos — atualmente, existem apenas quatro, segurança armada 24h, mais ventiladores e ar condicionados e descentralização do tratamento do HIV para as unidades básicas de saúde (UBSs). Uma nova reunião foi marcada para 13 de setembro para dar andamento às propostas, mas foi cancelada.

“A gente se aborrece por não ver resultados. A coisa está parada, sem uma nova reunião marcada, mas os nossos pacientes continuam precisando de tratamento. Temos que continuar essa batalha para não sermos esquecidos. Somos seres humanos e precisamos passar por todo o processo para ter qualidade de vida. Sem qualidade de vida, como vou sobreviver?”, finaliza Amélia.

O que diz a prefeitura

Em nota, a Prefeitura de Belém, por meio da Secretaria Municipal de Saúde de Belém, afirmou que criou uma comissão entre gestores e sociedade civil organizada para discutir e encaminhar propostas para reforçar a segurança no Casa Dia. Desde o início de setembro, segundo a gestão municipal, foi contratada uma empresa para reforçar a segurança no espaço, inclusive nos feriados. Sobre o novo furto, a pasta disse que  uma equipe da Sesma esteve ainda na segunda-feira (25) no espaço para fazer o levantamento do que foi levado e posterior reposição de equipamentos.

O espaço segue em funcionamento, mas com serviços restritos.  Funciona no momento os setores de atendimento, fornecimento de medicamentos na farmácia, o setor de nutrição para o fornecimento do leite e um médico que fica de plantão no espaço. As consultas médicas permanecem, temporariamente, suspensas.

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  • Fernando Assunção

    Atua como repórter no Alma Preta Jornalismo e escreve sobre meio ambiente, cultura, violações a direitos humanos e comunidades tradicionais. Já atua em redações jornalísticas há mais de três anos e integrou a comunicação de festivais como Psica, Exú e Afromap.

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