O tema da redação no primeiro dia do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2024, no último domingo (3), foi “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”.
Para se classificarem nesta etapa, os mais de 4,3 milhões candidatos precisaram elaborar um texto dissertativo de até 30 linhas e uma proposta de intervenção sobre o tema, também abordado pela produtora cultural e empresária Maju Passos, sócia da Escola Afro-brasileira Maria Felipa, em entrevista à Alma Preta.
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Na sua visão, é essencial levantar este debate, “uma vez que o maior desafio é justamente o reconhecimento da importância de trazer esse conhecimento para os nossos jovens e crianças, esse conhecimento africano que foi tão importante para a constituição do nosso povo”.
Criado em 1998, o Enem se tornou a principal porta de entrada para a educação superior no Brasil, por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e de iniciativas como o Programa Universidade para Todos (Prouni).
Essa não é a primeira vez que a etapa de redação do exame aborda um tema de origem africana. Em 2016, o assunto escolhido foi “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil”, pauta que também se relaciona diretamente com a lei 10.639/2003.
A legislação determina a inclusão de história e cultura africanas no currículo escolar, no entanto, ela não é aplicada em sete de cada dez Secretarias Municipais de Educação da região Sudeste do Brasil. Segundo a análise de Maju Passos, a cifra evidencia como o racismo é pautado no Brasil.
“Infelizmente não damos a importância que isso tem, e estamos falando de uma lei que existe há 21 anos. A gente só pode reverter essa situação a partir da consciência sobre os valores das heranças africanas”, pontua.
“O racismo ainda é considerado mimimi no Brasil, por mais que seja um crime, ele ainda não é tido como tal. Por conta disso, seguimos sem que essa lei seja efetivada, e isso demonstra de forma escancarada que nada acontece para aqueles que cometem racismo no Brasil”, complementa a empresária.
A instituição de ensino infantil com sede em Salvador é pioneira na educação antirracista e afro centrada registrada no Ministério da Educação (MEC). À frente da Maria Felipa desde 2020, Maju ressalta que por conta da organização desenvolver um trabalho importante para a valorização da cultura africana, a escola enfrenta há seis anos o racismo educacional.
“É importante dizer que a Maria Felipa é uma escola que segue todas as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). É uma escola normal antes de qualquer coisa. Mas justamente, pelo fato dela ser afro-brasileira, ela vem sofrendo vários ataques, fazendo com que as pessoas não entendam a sua proposta e a diminuam, revelando, dessa forma, o racismo da nossa sociedade”, esclarece.
“Algo que as outras escolas, sejam canadenses, americanas, chinesas, alemães, elas não são questionadas sobre a sua existência. Já a Maria Felipa é questionada o tempo inteiro”, compartilha ao celebrar a expansão para o Rio de Janeiro.
Maju ainda reflete que é preciso pensar de modo coletivo para que a pauta seja realmente debatida. “Para que a gente, de fato, implemente iniciativas, ações, onde a gente valore a nossa história africana e não deixe de se perder, porque o apagamento dessa história é o apagamento da nossa história enquanto povo brasileiro”, conclui