Na Semana do Consumidor, entre os dias 7 e 15 de março, grandes lojas disponibilizam as mais diversas promoções e descontos em compras, que vão desde eletroeletrônicos e se estendem até mesmo aos livros. O período pode servir de incentivo para que as pessoas invistam no consumo de literatura negra. Neste sentido, a Alma Preta Jornalismo conversou com a editora Esmeralda Ribeiro e a escritora Karina Vieira, que dão algumas sugestões de livros que podem ser comprados para fortalecer o trabalho de escritores negros e negras.
Esmeralda, uma das editoras da série literária independente Cadernos Negros e coordenadora do coletivo Quilombhoje Literatura, acredita que é de fundamental importância ler e adquirir obras de autores negros, a fim de fortalecer a rede de comercialização das escritas dessas pessoas.
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“Isso incentivará, de fato, que demais escritores produzam seus livros. Somos a maioria da população, mas esse fato não é traduzido em vendas das nossas produções, apesar de outros incentivos, como clube de leituras, saraus etc.”, pondera.
Visibilidade e identificação são outros dois pontos importantes para que o público negro passe a consumir a literatura produzida por seus iguais. Além disso, há a compreensão de que o indíviduo negro pode ser um produtor de saberes e o protagonista da própria história. É o que avalia a comunicóloga, escritora e podcaster Karina Vieira, integrante do podcast Afetos, que atuou como livreira por oito anos.
“Não menos importante, vem a sensação de pertencimento, que consequentemente traz benefícios. Saber que a sua história, e a história do seu povo, que, por vezes, não foi contada ou foi apagada, suprimida ou jogada para baixo do tapete, ganhou espaço, faz com que o povo negro saia da lógica hegemônica, pois existem outras formas de contar a história”, salienta Karina.
Descolonização do olhar de compra e o papel da educação
“Todos os espaços da educação, do berçário à universidade, deveriam ter em suas bibliotecas literatura de autores negros. Com certeza, seria um fomento importante para que a educação, em geral, tivesse mais contato com a nossa produção, porque leitores estão por toda a parte. Esta ação, por exemplo, contemplaria a Lei 10.649, que completa 19 anos marcados por poucos avanços”, avalia a escritora Esmeralda Ribeiro.
A comunicóloga Karina Vieira comenta ainda que, em sua experiência pessoal, não teve contato com a literatura negra nos espaços de ensino. Contudo, ela acredita que a nova geração de educadores já traz o debate racial para as salas de aula, do ensino básico à academia.
“Ter mais docentes negros conscientes é uma forma dos alunos negros se sentirem pertencentes aos mais diversos espaços possíveis. Estudei em universidade particular e, se não fosse por uma iniciativa extracurricular minha, eu não teria contato com a literatura negra”, relembra.
Para modificar e descolonizar o comportamento de compra, Karina ressalta um ponto em específico: a valorização dos pequenos produtores e escritores negros independentes. Ela avalia ainda que as editoras menores sofrem com a dificuldade de adentrar espaços formais de literatura, portanto, é fundamental investir no crescimento deste nicho.
Outros aspectos abordados pela podcaster são: o apoio aos financiamentos coletivos e a compra direta de livros com o próprio escritor negro. “Comprar de quem faz é uma forma da gente reaprender a comprar, a fim que isso fortaleça a comunidade preta”, diz.
O que consumir da literatura negra brasileira?
“Nem sempre são livros fáceis de ler, mas com certeza são de escritores que têm boas histórias para contar”, destaca Karina Vieira.
Quem ainda não possui o hábito de leitura, mas quer passar a integrar esse universo, a podcaster indica as obras “Nunca Vi a Chuva” e “Homens Pretos Não Choram”, de Stefano Volp. Cidinha da Silva também entra na lista de Karina como uma autora que traz a sensação de pertencimento ao leitor negro. Ela indica a obra de crônicas “Oh, Margem! Reiventa os Rios!”.
“Para quem gosta de poesia, eu indico muito a Ryane Leão, com a obra ‘Tudo Nela Brilha e Queima’, e também ‘Tudo Nela é de se Amar’, de Luciene Nascimento”.
“Eu não poderia deixar de citar, como formador de caráter, por assim dizer, Conceição Evaristo – tenho um carinho gigantesco por ‘Olhos D’Água –, e o livro que eu falo que é o meu livro da vida, que é ‘Um Defeito de Cor’, de Ana Maria Gonçalves. É um livro que você pode ler aos pouquinhos, que você vai ver a história de uma geração se desenhando. É lindíssimo!”, sugere a livreira.
Além de citar Conceição Evaristo, a editora do Cadernos Negros, Esmeralda Ribeiro, indica obras de Miriam Alves, Cristiane Sobral, Cuti Luiz Silva.
Karina completa a lista de sugestões, dessa vez para quem já é assíduo no hábito de consumo da literatura negra, com os autores Abdias Nascimento (O Genocídio do Negro Brasileiro), Renato Nogueira (Por Que Amamos). Quem deseja levar o debate racial para o campo da espiritualidade, a obra “Ocupar, resistir, Subverter”, de Ronilso Pacheco, é a indicação dela.
Literatura e escritores além das fronteiras
“A leitura vai da paixão de cada leitor. Acrescento também autoras e autores traduzidos para o português, como: Toni Morison, Alice Walker, Chimamanda Ngozi Adichie, ‘Filho Nativo’, de Richard Whrigt, ‘O Homem Invisível’, de Ralph Ellison, obras de James Baldwin, Grada Kilomba e Paulina Chiziane”, comenta Esmeralda Ribeiro.
A podcaster Karina Vieira acrescenta à lista de indicações sua escritora negra favorita: Bell Hooks, com as obra “Anseios” e também “Tudo Sobre o Amor”, trilogia que fala sobre o amor não-romântico, com a abordagem de outros aspectos, como o amor como prática e como ação.
“Para quem gosta de ficção científica, indico a rainha, que é Octavia Butler, escritora da obra ‘Kindred’. Além disso, tem o livro ‘Fique Comigo’, da Ayòbámi Adébáyò, ‘A Outra Garota Negra’, da Zakiya Dalila, ‘Seus Olhos Viam Deus’, da Zora Neale Hurston e o livro ‘Na Corda Bamba’, de Kiley Reid. Essas são obras de literatura contemporânea”, finaliza a comunicóloga.
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