O prefeito de Belém (PA), Edmilson Rodrigues (PSOL), sancionou a lei nº 9.914 que institui o dia 16 de março como o Dia Municipal de Combate ao Racismo Ambiental e Defesa da Justiça Climática. O texto aprovado é de autoria da Bancada das Mulheres Amazônidas, também do PSOL, primeiro e único mandato coletivo da Câmara Municipal de Belém e da região Norte do país. A bancada é formada pela assistente social, Gizelle Freitas; pela socióloga e pessoa com deficiência, Kamilla Sastre; e pela liderança comunitária Fafá Guilherme.
A lei, sancionada na última segunda-feira (28), reconhece o dia 16 de março como um marco nos debates e lutas contra as mudanças climáticas, o racismo ambiental e em defesa da justiça climática. Nesta data, em 1998, foi reconhecido o Protocolo de Kyoto, tratado internacional que determinou que países ricos reduzissem a emissão de gases do efeito estufa. No dia 16 de março também é celebrado o Dia Nacional de Conscientização Sobre Mudanças Climáticas no Brasil, que busca viabilizar debates e mobilizações em torno da criação de alternativas sustentáveis de processos produtivos e de organização social e econômica.
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Em entrevista à Alma Preta Jornalismo, a covereadora Gizelle Freitas falou da importância de se municipalizar o debate, levando-se em conta que a capital paraense tem ampliado a discussão sobre a preservação da Amazônia, já que Belém será sede da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças de Clima (COP-30), em 2025.
No mês passado, a cidade recebeu representantes dos governos de nove países que têm a floresta amazônica em seu território para a Cúpula da Amazônia, que discutiu o desenvolvimento sustentável da região. De acordo com a política, porém, os avanços são pouco sentidos pela população. Confira a entrevista:
Alma Preta: O que é o racismo ambiental?
Gizelle Freitas: Quando a gente fala em racismo ambiental, queremos dizer que as catástrofes, os desastres e acidentes ambientais e, no caso do Pará, as fortes chuvas, atingem toda a comunidade de determinado território, mas os impactos maiores são sentidos nas periferias. E quem vive nas periferias? Principalmente pessoas negras e étnicas, são essas famílias que perdem casas, documentos, etc. A gente fala em racismo porque, em geral, os governos não têm políticas públicas nem de prevenção e nem de acolhimentos a esse grupo nas situações de desastres, ou seja, são colocados em igrejas, escolas e outros espaços adaptados até que a catástrofe se minimize para, a partir dali, receberem auxílios governamentais que, em geral, são muito baixos.
Qual a importância desse debate em um momento onde os olhos do país e do mundo se voltam para a região amazônica com a realização de eventos como a COP-30?
Bom, desde que o mundo é mundo se fala em Amazônia, mas a região ainda é pensada apenas como floresta e mata, que sim, é parte significativa do nosso território, mas também é preciso discutir o povo, as pessoas que compõem a Amazônia. Então, o momento atual é importante para expor o caos social que vivemos aqui no estado, com muitas cidades sem saneamento, macrodrenagem, uma região que é muita rica, mas de povo empobrecido, com péssimo desenvolvimento humano e ausência de políticas públicas, além do cenário de violência contra defensores dos direitos humanos e famílias do campo. Agora o momento é de difundir o que os movimentos sociais sempre falaram e reforçar que a gente precisa de uma política mundial que combata esses elementos. É a hora de lutar para garantir isso!
As autoridades da Amazônia vêm dando o devido valor a essa discussão?
No meu ponto de vista, não há avanços nesse sentido, como foi mostrado na Cúpula da Amazônia. As discussões feitas pelos movimentos sociais não entraram em pauta na cúpula. Uma das mais centrais foi o tema da exploração de petróleo na Foz do Amazonas, que foi praticamente ignorada pelos presidentes. Então, desde Kyoto, que pelo menos na teoria reconheceu que a crise climática é responsabilidade dos países ricos e não das pequenas comunidades, não tem efetivamente uma política de combate ao racismo ambiental e mitigação dos efeitos climáticos.
A aprovação do Dia Municipal de Combate ao Racismo Ambiental e Defesa da Justiça Climática pela Câmara dos Vereadores de Belém representa um avanço?
Podemos dizer que temos uma câmara dos vereadores de direita, que tem repulsa a debates que envolvem reforma agrária, direitos LGBTQIA+, entre outros assuntos que eles identificam como de esquerda. Já a temática do meio ambiente, em geral, costuma ser aprovada, sim. Mas considero um avanço aprovar um projeto com esse tema, porque quando o projeto entra na pauta, isso significa que a gente pode falar dele na tribuna, envolvendo também outros vereadores. Serviu também para demarcar que o nosso mandato coletivo tem como central o tema do meio ambiente.
Qual a legislação municipal vigente no que se refere ao enfrentamento do racismo de modo geral?
De modo geral, a gente tem o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado na câmara e sancionado ano passado, de autoria da então vereadora Lívia Duarte [hoje deputada estadual pelo Psol]. É uma iniciativa importante porque, com a aprovação da CMB, a gente consegue fiscalizar até que ponto ele está sendo concretizado. Fora o estatuto, não me recordo de nenhuma outra lei do município que aborde esse tema.
Quais ações são previstas para o dia 16 de março?
Existe a lei federal que coloca o 16 de março como dia nacional de combate à mudança climática. Então, com a municipalização, a ideia é que essa discussão se aprofunde nas escolas, que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente reforce a educação ambiental nas escolas e espaços públicos, que os órgãos e secretarias também estimulem a criação de campanhas de impacto local com esse tema. A gente vive uma crise climática que uma mídia de Belém reportou, recentemente, que os termômetros estavam marcando 46ºC, por isso a gente precisa cada vez mais falar do tema, até porque parte significativa da população não sabe o que é crise climática, mas sabe que está quente, que chove cada vez menos, que o açaí não está saindo na data correta da safra, etc. Só que não relaciona isso ao cenário climático e ao fato da gente estar vivendo um período drástico ambientalmente falando e que precisa da ação dos governos.