As pesquisas eleitorais combinam diferentes fatores através de métodos matemáticos e determinam possíveis tendências de comportamento. As que tratam da intenção de voto, ainda mais populares no período que antecede a ida da população às urnas, também funcionam desta forma e, em geral, consideram idade, gênero, escolaridade, renda e ocupação aqui no Brasil. A ausência do recorte racial impacta diretamente a população negra, conforme apontam especialistas ouvidos pela Alma Preta Jornalismo.
“Quando você não tem um recorte étnico-racial, é impossível definir um marcador de táticas e estratégias fundamentais para a elaboração de proposta políticas que atentam às necessidades dessa população”, contextualiza o professor Juarez Xavier.
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Especificamente sobre as pesquisas de intenção de voto, o cientista político Márcio Juliboni destaca que a falta do recorte racial explica a estruturação histórica da discussão política no Brasil. “Vários estudiosos dizem que opinião pública é, na verdade, a opinião dos que conseguem espaços e acesso aos espaços públicos da sociedade. Uma pesquisa de opinião pública é também um espaço para que grupos sociais se manifestem sobre suas demandas. À medida que você faz esse recorte por raça, fortalece e expõe as demandas de cada parcela da sociedade”, analisa.
O professor Juarez relembra o histórico do movimento negro para a inserção e interpretação dos dados sobre raça há mais de 40 anos. “A necessidade da observação do recorte racial vai de encontro com a proposta política elaborada pelo movimento negro desde os anos 70, que era observar quatro fatores fundamentais: definição da ação estratégica da política; definição do perfil da população negra; encontrar os melhores mecanismos para a população negra; e as melhores políticas de inclusão e acesso à temática racial”, explica.
A discussão acerca do recorte político-racial é comum no período eleitoral nos Estados, por exemplo, fato que também pode ser interpretado através da estruturação e da luta negra no país. “Nos EUA, o movimento dos direitos civis surgiram justamente para fazer com que os negros fossem reconhecidos”, aponta Juliboni.
Para Juarez, o recorte racial em pesquisas eleitorais “cria mecanismos de ter um contato mais ético, possível e transparente com a população negra, sem restringir isso aos que tem mais acesso, incluindo também as pessoas que vivem às margens e em situação de extrema vulnerabilidade”.
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Os institutos de pesquisa e os dados sobre a população
A partir da suspensão do Censo demográfico de 2020, que seria realizado em 2021, o quadro sobre quem é a população que vive no Brasil se mantém desatualizado. Além do desenvolvimento de políticas públicas e programas sociais, a falta de informações sobre a distribuição e o perfil da população também implica no cenário eleitoral e na realização de pesquisas. “A falta de dados demográficos limita o debate eleitoral e o perfil traçado para a definição das intenções de voto”, argumenta o cientista político Márcio.
Segundo o Instituto Datafolha, o universo utilizado para a realização das pesquisas está nos dados de eleitores aptos no país, fornecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a partir dos dados do Censo IBGE. De acordo com o instituto, são levadas em consideração a idade, sexo, escolaridade e distribuição regional dos entrevistado para a pesquisa.
A Vox Populi, por sua vez, afirma que considera as variáveis sociodemográficas de sexo, idade, escolaridade, renda familiar, raça e religião para o cruzamento de dados e resultados de pesquisas de intenção de voto.
Para o diretor comercial do Instituto PhD, André Pioli, a temática do recorte racial merece ser mais estudada no universo de pesquisas de intenção de voto, ponto que deve mudar já para as próximas eleições. “Realizamos uma bateria de testes para identificar o impacto das variáveis na decisão nas urnas e, para 2022, está na pauta dos estatísticos do instituto a inclusão de variáveis raciais”, conta.
Com pesquisas de intenção de voto que contemplam a intenção de uma amostra real da população, os institutos podem influenciar até mesmo na elaboração de propostas e discursos feitos pelos candidatos, explica Juliboni, já atento às eleições presidenciais, que acontecem no próximo ano. “Para as eleições de 2022, isso colocaria em evidência as demandas da população negra que é colocada às margens pela esquerda e, na maioria dos casos, desconsiderada pela direita”, prevê.