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É preciso racializar o progressismo

25 de outubro de 2019

O pesquisador João Luiz Moura escreveu para o Alma Preta uma análise sobre a repercussão do julgamento da prisão em segunda instância

Texto / João Luiz Moura | Edição / Nataly Simões | Imagem / Reprodução/El Periódico

Tenho observado com calma aquilo que hoje atende pelo nome de progressismo no Brasil. Sobretudo as figuras mais novas que desconhecem por completo a história de gente que, literalmente, deu a vida por um mundo mais justo, belo e bom.

Em dados concretos e atuais, é curioso observar a discussão sobre a prisão em segunda instância. É muito importante ter em vista que o judiciário brasileiro, a mídia progressista, os partidos de esquerda e tantas outras organizações e pessoas se movimentaram para discutir essa problemática jurídica somente quando uma personalidade política importante foi alvo dessa interpretação inconstitucional.

A repercussão sobre o julgamento da constitucionalidade da prisão em segunda instância no Supremo Tribunal Federal (STF) tem se pautado na possibilidade de beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Apesar de o presidente do supremo, o ministro Dias Toffoli, ter afirmado que a discussão sobre o tema “não se refere a nenhuma situação particular”.

O cumprimento da pena antes de esgotados todos os recursos é executado no país desde 2016. Uma mudança no posicionamento da corte poderá beneficiar condenados em segundo grau, como é o caso de Lula e mais 4.895 pessoas, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A demasiada visibilidade em torno do caso do ex-presidente petista revela apenas a invisibilidade com a qual a população negra e periférica sempre foi tratada. Não é de hoje que negros e negras envelhecem nas prisões sem o devido processo legal.

Em 2016, a população carcerária do Brasil era de 726,7 mil presos, segundo levantamento do Departamento Penitenciário Nacional (Depen). Deste total, 64% eram negros. Em 2019, o número saltou para 812.564, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Dos mais de 812 presos, 41,5% são provisórios, ou seja, 337.126 ainda não foram condenados nem em primeira instância.

O encarceramento em massa no país, especialmente da população negra, é denunciado há décadas. Na semana passada, a filósofa e ativista norte-americana Angela Davis denunciou a situação para mais de 15 mil pessoas em São Paulo. No campo religioso, por exemplo, há tempos Ras André, Liz Guimarães e Ronilso Pacheco também denunciam a superlotação dos presídios brasileiros.

E veja, eu poderia até tensionar o fato de que o debate ainda gira em torno da prisão ser uma alternativa. Estamos discutindo apenas qual será o momento em que essa violência será efetivada, ou seja, continuamos nas bordas.

Com efeito, talvez fosse necessário um certo revisionismo ético nas causas que inspiram algumas “resistências”. Se a mesma boca que grita pela liberdade de um HOMEM BRANCO, RICO e FAMOSO, gritasse contra toda e qualquer violência cujo objetivo seja encarcerar, nós poderíamos viver em um mundo onde, como disse o profeta bíblico Amós, “a justiça corra como as águas, e aquilo que é reto, como um rio que nunca seca.”

João Luiz Moura é pedagogo, teólogo e cientista da religião. Coordenador de projetos no Instituto Vladimir Herzog e pesquisador nas áreas de direito, economia e religiosidade.

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