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Emmanuel Macron afirma que África tem problema civilizacional e critica taxa de 7 a 8 filhos por mulher

Afirmação feita durante encontro do G20 gerou polêmica em redes sociais e acusações de racismo, além de aproximação com o discurso da antiga adversária Marine Le Pen.
O presidente francês, Emmanuel Macron, participa de coletiva de imprensa ao dinal da Cúpula do G20, em Hamburgo, Alemanha, 8 de julho de 2017

Foto: Ludovic Marin/AFP

11 de julho de 2017

No último dia 8 de julho, em uma coletiva de imprensa, o recém-eleito presidente francês, Emmanuel Macron, fez afirmações controversas sobre o continente africano. A entrevista foi realizada durante o encontro do G20 de 2017, realizado em Hamburgo, na Alemanha.

O encontro é considerado um dos mais relevantes da política internacional. Nele se reúnem as 20 nações com maiores produtos internos brutos do planeta. Este ano, a reunião foi marcada por protestos em massa e confrontos nas ruas entre policiais e manifestantes anticapitalismo.

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Um repórter perguntou ao presidente francês sobre as discussões realizadas no encontro acerca da pobreza no continente africano. Ele citou cálculos que afirmam que o Plano Marshall, financiamento americano que reconstruiu a Europa após a Segunda Guerra Mundial, custou 150 bilhões de dólares em valor atualizado. E a partir disso questionou Macron sobre o qual será o valor aplicado pelo G20 nos países africanos.

“De forma concreta, quanto os países do G20 estão dispostos e se comprometer com a África hoje e qual é o posicionamento francês sobre o assunto?”. Macron respondeu que a pergunta não era razoável, pois se tratavam de problemas distintos.

Para ele, os problemas africanos seriam os Estados que falharam, transições democráticas e demográficas complexas, além de outros, como drogas, tráfico humano e armas; fundamentalismo violento e terrorismo islâmico. Ele também afirmou que a África tem exemplos de crescimento excelentes, o que prova que o continente é uma terra de oportunidades.

Pela profundidade, ele afirmou ao repórter que os problemas da África só seriam resolvidos com um plano sofisticado e não uma transferência direta de dinheiro como foi o Plano Marshall.

O caso europeu, segundo o presidente, é diferente, pois a Europa, à época do plano, “já tinha seus equilíbrios, suas fronteiras e sua estabilidade”. Ao passo que, para Macron, o problema da África é “civilizacional”. Ele completou criticando o fato de que alguns países do continente têm média de 7 a 8 crianças por mulher, o que ele afirma ser “um problema de transição demográfica”.

Segundo dados de 2016 do World Factbook da CIA, no entanto, apesar de manter as taxas de fertilidade mais altas do mundo, nenhum país africano chega a essa média de filhos por mulher. O país africano com a maior taxa de fertilidade, o Níger, chega a 6,62 filhos por mulher. Dados do período 2010-2015 da ONU mostravam números um pouco maiores, com a liderança do Níger, com 7,4 filhos por mulher, seguido pela Somália, com 6,61.

Macron acrescentou que a receita não estaria na transferência direta de dinheiro, mas em governanças rigorosas e no combate à corrupção. Questões que, para ele, apesar de exigirem responsabilidade externa, são problemas africanos.

Em janeiro, o Alma Preta fez uma análise sobre o que Trump estava preparando para o continente africano, e vários indícios de campanha apontavam para a corrupção como um entrave aos negócios americanos em território africano, tal qual apontou o presidente francês.

Macron venceu a eleição francesa se apoiando no fragilizado discurso da globalização e da força da União Europeia. Ambos os discursos foram chacoalhados pelo protecionismo da saída do Reino Unido do bloco europeu, o Brexit, da eleição inesperada de Donald Trump nos Estados Unidos, e pelos bons resultados da adversária de Macron, a líder conservadora da Frente Nacional, Marine Le Pen.

Liberdade, igualdade e fraternidade

A França é conhecida mundialmente por seus filósofos e sociólogos e também pela Revolução Francesa, que criou as bases políticas do mundo Ocidental capitalista sob o lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”.

No entanto, o mesmo país foi um dos mais avançados na exploração do continente africano, dominando territórios extensos ao longo de todas as regiões do continente. Países como Benin, Argélia, Mali, Níger, Senegal, Costa do Marfim, Chade, Camarões e Congo foram dominados pelos franceses até recentemente.

Foi esse domínio, por exemplo, que suscitou as bases para a resistência negra intelectual do movimento da Négritude, liderado por Léopold Sédar Senghor e Aimé Cesaire. Foi também sob esse clima que Frantz Fanon escreveu seu clássico “Pele Negra, Máscaras Brancas”.

As críticas a Macron viraram notícias em diversos veículos on-line e se tornaram motivo de discussão em redes sociais.

O jornal Daily Vox, da África do Sul, afirmou que “Macron não é progressista quando se trata da África” e criticou o tratamento que ele dispensou aos 54 países do continente ao tecer críticas à África, algo que não é compatível com a posição que ocupa. O jornal também comparou o posicionamento do francês com as ideias de Marine Le Pen.

Já o jornal francês, Libération apontou que a crítica de Macron de culpar a superpopulação pela pobreza no continente, além das mulheres africanas por terem filhos demais, é uma distração sobre o papel do colonialismo na produção desses problemas.

O site Quartz Africa publicou que a fala do presidente francês foi racista e lembrou uma fala do ex-presidente francês Nicolas Sarcozy, de 2007, quando ele afirmou que a África “não tinha entrado completamente na história”.

*Este texto sofreu correções e teve a imagem de capa atualizada após a data de publicação.

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  • Solon Neto

    Cofundador e diretor de comunicação da agência Alma Preta Jornalismo; mestre e jornalista formado pela UNESP; ex-correspondente da agência internacional Sputnik News.

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