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Ao discutir masculinidade, homens negros reivindicam humanidade negada pelo racismo

Impactos dos comportamentos associados às expectativas sociais de gênero fizeram as discussões sobre masculinidade se popularizarem neste ano

17 de dezembro de 2019

Um estudo da Organização Pan-Americana da Saúde (OPS), divulgado em novembro, comprovou que a masculinidade tóxica reduz a expectativa de vida dos homens na América em até 5,8 anos, sendo os afrodescendentes os mais afetados. Os impactos dos comportamentos associados às expectativas sociais de gênero fizeram as discussões sobre masculinidade se popularizarem em 2019.

O debate sobre a masculinidade dos homens negros e não-negros possui diferenças fundamentais, uma vez que o tratamento dispensado aos homens negros na sociedade brasileira é marcado pela questão racial. É o que defende o fotógrafo pesquisador de religiões afro-brasileiras Roger Cipó, curador e mediador do “TROCATROCA”, diálogos de masculinidades plurais.

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“Há uma diferença central na discussão sobre masculinidade, pois nós homens pretos temos debatido esse tema para reivindicar a humanidade que o racismo nos nega. Ao mesmo tempo que sinalizamos que a construção do que é ser homem instituída pelo homem branco não diz respeito a nós”, explica.

Cipó define como masculinidade tóxica a masculinidade branca que, segundo ele, é composta por comportamentos que visam estabelecer poder sobre outros corpos, levando os homens negros e não-negros a construírem relações baseadas na violência e na dominação.

“A falta de consciência em homens pretos faz com que miremos nossas noções de humanidade na branquitude. É essa referência de poder que encontramos, por isso os homens pretos reproduzem e se valem de uma masculinidade violenta, que não diz sobre si e não garante lugar de poder na estrutura patriarcal”, explica.

“Ao mirar na ideia de masculinidade branca, homens pretos colaboram com a manutenção do status quo da branquitude e facilitam o projeto de extermínio que mata a si e seus iguais”, acrescenta.

Por que “TROCATROCA”?

Com mais de 30 mil seguidores nas redes sociais, Roger Cipó usa sua influência digital para abordar questões relacionadas à condição dos homens negros, identidades masculinas e afetividades na luta antirracista. É neste contexto que surge o “TROCATROCA”. O nome é uma provocação que a expressão faz ao remeter ao imaginário das primeiras descobertas sexuais.

“A necessidade de discutir a masculinidade no campo online somada à urgência de criar um espaço onde homens pretos plurais pudessem compartilhar a construção das nossas identidades, nosso papel enquanto homem e os caminhos para relações melhores de cuidado e fortalecimento levou ao surgimento dos encontros”, conta.

Os diálogos presenciais abertos ao público acontecem desde agosto, uma vez por mês, no espaço cultural Aparelha Luzia, no centro de São Paulo (SP). Nas cinco edições de 2019, 33 homens negros de diferentes gerações e identidades de gênero participaram como convidados.

Cipó acredita que o discurso surte mais efeito quando há uma interação corporal, por isso os encontros começam com o ato de se abraçar.

“É um ato inspirado numa máxima do candomblé ketu, que ao cultuar Oxóssi cantamos em iorubá ‘descendentes de Alaketu, abracem uns aos outros’. Oxóssi é a primeira divindade iorubá ‘plantada’ no Brasil. Descendemos de seu reino, Alaketu, e se seu culto pede que nos abracemos para enfatizar que o afeto nos é importante. Eu acredito que somente nossas tradições podem devolver a humanidade que o racismo nos negou”, completa.

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  • Nataly Simões

    Jornalista de formação e editora na Alma Preta. Atua há seis anos na cobertura das temáticas de Diversidade, Raça, Gênero e Direitos Humanos. Em 2023, como editora da Alma Preta, foi eleita uma das 50 jornalistas negras mais admiradas da imprensa brasileira.

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