PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

Foto contesta versão da polícia sobre morte de homem de muletas em Santos

Policiais afirmaram que homens estavam armados e com drogas; fotografia mostra uma das vítimas minutos antes da ação em porte de celular e das muletas, sem armas ou mochilas
Imagem mostra Leonel Santos, homem que usava muletas e foi morto pela Polícia Militar. Ele era branco e tinha cabelos curtos e pretos.

Foto: Acervo da família de Leonel Santos

13 de março de 2024

Uma foto tirada por um vizinho, minutos antes de uma ação policial, contesta a versão oficial dos agentes de segurança sobre a morte de Leonel Santos e Jefferson Miranda, em 9 de fevereiro, em Santos, no litoral paulista. O registro, feito às 20h03, mostra Leonel sentado em uma escadaria, com o celular nas mãos e as muletas apoiadas ao lado. Os moradores também afirmam que as sacolas presentes nas imagens são de lixo, que são recolhidas pela coleta no bairro.

Responsável pela foto, a testemunha afirmou ter caminhado pela rua por volta das 20h20, quando percebeu que Leonel estava na mesma posição. Outra testemunha relatou que passou pela rua, dialogou com os rapazes, que estavam desarmados e sem o posse de drogas, e presenciou o início da abordagem policial.

Quer receber nossa newsletter?

Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!

Foto: Reprodução

De acordo com o Boletim de Ocorrência, os policiais Valci José Gouveia de Jesus e Rahoney de Paula Vieira chegaram ao local às 21h. O registro oficial afirma que Leonel Santos estava armado, efetuou disparos contra os policiais, e carregava 196 papelotes com pedras de crack, 22 papelotes e potinhos com Haxixe. Jefferson Miranda também estava armado, segundo o registro policial, e em posse de R$ 210, duas mochilas de cor preta, uma pochete, um rádio transmissor, um telefone celular e uma sacola plástica de cor cinza.

Os familiares de Jefferson e Leonel Santos afirmam que, depois dos dois terem sido baleados, a rua foi isolada e a ambulância demorou cerca de duas horas para chegar ao local. Os familiares também não conseguiram prestar socorros para as vítimas, por conta do isolamento feito pelos agentes de segurança.

“Os policiais falaram aquela história de que foi troca de tiros, mas ele usava muletas. Ele não trocava tiros, até porque ele não consegue. Ele mal conseguia segurar as muletas dele, uma perna dele era atrofiada, era uma menor que a outra. Como ele ia correr se ele não conseguia largar das muletas dele? Porque depois de atirar ele ia ter que correr, e como ele fazer isso com a muleta? É inviável”, conta Soraia*, uma familiar de Leonel Santos.

O relato dos policiais é de que realizaram uma incursão pela área de mata do Morro do São Beto para acessarem a Rua São Mateus, onde dizem ter visualizado dois homens armados, um com uma mochila e outro com uma sacola. O Boletim de Ocorrência diz que quando perceberam a presença dos policiais, Leonel e Jefferson efetuaram disparos e os policiais, então, revidaram aos ataques com tiros de fuzil. 

O sargento Valci José Gouveia de Jesus efetuou três disparos e o cabo Rahoney de Paula Vieira, sete. O caso foi registrado como Morte Decorrente de Intervenção Policial e está anotado como um “Crime tentado”, que foi o de homicídio por parte das vítimas contra os policiais. Foi registrado também como Art 33, como crime de Entorpecentes, por conta da suposta posse de drogas sem autorização. O fato foi registrado pelo escrivão Renato Martins e pela delegada Mariana Castro Lopes Pilotto, do 1º Distrito Policial de Santos. 

Testemunha diz que polícia ameaçou quem tentou filmar ação

Os familiares contestam a versão. Roberta* conta que aquele não era um ponto de tráfico e que os rapazes “estavam conversando quando os policiais vieram pelo mato”. Os relatos das testemunhas ainda afirmam que os dois rapazes, baleados e no chão, foram agredidos pelos agentes de segurança com chutes e coronhadas na cabeça.

Ela também relata que os policiais ameaçaram todos que tentaram filmar a ação e que vasculharam câmeras de segurança na vizinhança. Para ela, os policiais forjaram drogas e armas nas vítimas.

Familiar de Leonel, Soraia conta que o rapaz foi encontrar o amigo Jefferson, de quem era muito próximo. Passado às 20h, o horário combinado de Leonel para retornar para residência, Soraia se deslocou para o lugar onde o homem estava, quando ouviu um barulho de tiros e ficou aflita. Foi então que começou a correr para o endereço, e foi bloqueada pelos policiais.

Cláudia*, familiar de uma das vítimas, promete lutar por justiça. “Eu não vou parar enquanto eu tiver vida, enquanto eu tiver suspiro, eu vou lutar pela justiça, porque o que fizeram não é certo. Tiraram a vida do Jefferson com um tiro de fuzil”.

Questionada pela Alma Preta, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) não se posicionou até a publicação desta reportagem. Caso a pasta se manifeste, o texto será atualizado.

* Nomes fictícios para preservar a identidade das pessoas citadas.

Apoie jornalismo preto e livre!

O funcionamento da nossa redação e a produção de conteúdos dependem do apoio de pessoas que acreditam no nosso trabalho. Boa parte da nossa renda é da arrecadação mensal de financiamento coletivo.

Todo o dinheiro que entra é importante e nos ajuda a manter o pagamento da equipe e dos colaboradores em dia, a financiar os deslocamentos para as coberturas, a adquirir novos equipamentos e a sonhar com projetos maiores para um trabalho cada vez melhor.

O resultado final é um jornalismo preto, livre e de qualidade.

  • Pedro Borges

    Pedro Borges é cofundador, editor-chefe da Alma Preta. Formado pela UNESP, Pedro Borges compôs a equipe do Profissão Repórter e é co-autor do livro "AI-5 50 ANOS - Ainda não terminou de acabar", vencedor do Prêmio Jabuti em 2020 na categoria Artes.

Leia Mais

PUBLICIDADE

Destaques

AudioVisual

Podcast

papo-preto-logo

Cotidiano