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Implante para prevenir gravidez de mulheres vulneráveis é criticado por eugenia

Movimentos sociais pedem revogação de portaria do Ministério da Saúde que institui implante contraceptivo para mulheres em situação de rua e em outras situações de vulnerabilidade social; relembre casos em que o presidente Jair Bolsonaro apoiou a esterilização de pessoas pobres

 

A imagem mostra uma moradora de rua grávida, sentada em um colchão velho

Foto: Texto: Caroline Nunes | Edição: Nataly Simões | Imagem: Reprodução/Agência Pública

3 de maio de 2021

A Portaria Nº 13/2021, publicada pelo Ministério da Saúde  e aprovada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), institui o implante subdérmico de etonogestrel como estratégia de prevenção à gravidez por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). A medida, considerada eugenista por movimentos sociais, abrange mulheres em situação de rua, portadoras de HIV ou Aids, privadas de liberdade, trabalhadoras do sexo ou em tratamento para tuberculose.

Além da revogação da portaria, organizações e coletivos exigem que a ampliação de método contraceptivo seja disponibilizada de forma universal. “Devemos chamá-la pelo que é: esta é uma política marcadamente discriminatória, higienista, classista, racista e baseada em estigmas sobre as populações às quais se destina, que já sofrem obstáculos e impedimentos no exercício da maternidade e da autonomia corporal”, afirma a nota da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Aids).

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Cerca de 30 movimentos sociais se uniram para elaborar a nota e subir no Twitter as hashtags #eugenianão e #acessouniversalsim contra a portaria, que deve entrar em vigor dentro de 180 dias, de acordo com o Ministério da Saúde. A proposta inicial, na qual se baseou o documento, solicitava a ampliação da oferta de contraceptivos pelo SUS que deveriam ser disponibilizados a todas as mulheres em idade reprodutiva.

Segundo a associação, no entanto, somente com base no impacto orçamentário a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) definiu as populações às quais a portaria se restringiria. A doutora em Saúde Pública, Emanuelle Góes, destaca que um dos traços eugenistas da portaria é o fato de que não existe nenhum tipo de pesquisa que diga que o procedimento proposto é necessário para esse grupo de mulheres.

“Considerando que o Brasil possui uma precária cobertura e fornecimento de métodos contraceptivos para as mulheres em geral, por que fazer uma política direcionada para determinados grupos de mulheres que já por si só já são estigmatizadas e vulnerabilizadas e sofrem violências institucionais?”, questiona Emanuelle.

A portaria também viola os princípios de acesso igualitário e livre exercício do planejamento familiar, conforme estabelece a lei 9.263/96 e os princípios de universalidade e equidade do SUS, diz o comunicado dos movimentos sociais. O documento destaca também que a seleção de determinados grupos para experimentos reprodutivos ou estratégias de controle natalista “é uma marca indelével da história do Brasil e da saúde reprodutiva mais amplamente, onde populações mais vulneráveis foram e ainda são submetidas a procedimentos compulsórios que violam seus direitos humanos”.

Propostas de esterilização e de controle de natalidade, como a nova portaria, sempre estão presentes no cotidiano das mulheres negras, periféricas e em vulnerabilidade social, lembra Emanuelle.  “Não existe decisão autônoma das mulheres”, pondera a doutora.

Histórico de apoio à esterilização

Não é a primeira vez que o presidente Jair Bolsonaro apoia ações semelhantes à portaria. Em 2018, enquanto ainda era candidato à presidência da república, Bolsonaro afirmou na marcha dos prefeitos em Brasília (DF) que já considerava colocar como proposta a esterilização de pessoas pobres, no intuito de combater a miséria no país.

Na ocasião, o presidente afirmou que “um homem e uma mulher com educação dificilmente vão querer ter um filho a mais para engordar um programa social”. Nos quase 30 anos em que Bolsonaro foi deputado federal, o discurso de controle de natalidade aplicado somente para a população pobre se perpetuou.

“Só tem uma utilidade o pobre no nosso país: votar. Título de eleitor na mão e diploma de burro no bolso, para votar no governo que está aí. Só para isso e para mais nada serve, então, essa nefasta política de bolsas do governo”, declarou Bolsonaro, em novembro de 2013, durante uma plenária na Câmara dos Deputados, em crítica aos programas que beneficiam a população mais vulnerável, como o Bolsa Família.

Leia também: ‘Sem censo, vulnerabilidade da população negra pode aumentar nos próximos anos’

Antes disso, em 1992, durante seu terceiro ano como deputado, Bolsonaro afirmou que uma política de natalidade deveria ser rígidamente empregada. “Não podemos mais fazer discursos demagógicos, apenas cobrando recursos e meios do governo para atender a esses miseráveis que proliferam cada vez mais por toda esta nação”, disse durante uma plenária.

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