Para encerrar o mês do orgulho LGBTQI+, o Alma Preta traz um bate-papo com as integrantes do Coletivo Sapato Preto Amazônida
Texto: Flávia Ribeiro | Edição: Nataly Simões | Imagem: Acervo pessoal
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O debate sobre identidade como afirmação política, atravessado pelo território e entre gerações, são algumas das pautas do Coletivo Sapato Preto – Negras Lésbicas Amazônidas. Para fechar o mês de orgulho LGBTQI+, o Alma Preta traz a história de mulheres que atuam em nome da sexualidade e território como identidade e que na pandemia da Covid-19, o novo coronavírus, também atuam em nome de comunidades que estão sofrendo os impactos econômicos da crise epidemiológica.
A ideia de criar um coletivo para debater questões especificas surgiu no ano de 2017, conforme destaca a estudante universitária Juliana Damasceno. “Observávamos que a pauta da sexualidade era um marcador importante, assim como o reconhecimento da pluralidade da nossa identidade enquanto negra e amazônida”, afirma.
Em 2018, o coletivo realizou um evento de lançamento. “Um ponto interessante é a intergeracionalidade. Temos uma juventude que compõe nosso coletivo, mas também temos mulheres mais velhas. Em ambos os grupos geracionais, temos também mulheres que são acadêmicas e as que não são. A gente tenta manter esse diálogo dentro do próprio grupo, reverenciando quem veio antes, mas sem esquecer o que a juventude também pode ensinar”, explica Juliana.
Situado no Pará, o Sapato Preto atualmente é composto por 12 integrantes entre mulheres negras lésbicas /sapatães ou/e sapatões, como livremente quiserem se autodeclarar dentro dessa identidade. Para elas, a questão do território é um diferencial importante. “Queremos trazer as nossas narrativas que são invisibilizadas em comparativo aos eixos Sul/Sudeste/Centro Oeste e até Nordeste. Há um apagamento da presença majoritária de sujeitas negras na Amazônia. Fala-se, lê-se Amazônia com a visão colonizada de que aqui há somente florestas, água e etnias indígenas preponderantes. Ignorando que o processo de construção deste território também foi feito pelas mãos negras”, pondera a advogada Darlah Farias.
Outro ponto destacado pelas integrantes foi o de que conseguiram aprovar projetos em editais, o que impactou na vida de outras pessoas. Neste período de pandemia, elas conseguiram distribuir alimentos. “Rapidamente identificamos que os corpos negros foram/são os mais impactados pelo novo coronavírus. Muitas mulheres negras (cisgênero/ transgênero/travesti/lésbicas/bissexuais/empregadas domésticas/ profissionais do sexo/etc) vêm nos procurar para auxílio alimentar. A dignidade alimentar destas mulheres está completamente comprometida considerando que para além de enfrentar uma pandemia com acesso escasso à saúde, ainda têm que cumprir as orientações do isolamento social, o que afetou diretamente a renda familiar, incluindo das próprias integrantes do coletivo”, comenta Darlah.
Por meio do Fundo Brasil Direitos Humanos, foram distribuídas 80 cestas de alimentos e kits de higiene, além de máscaras de proteção, na região metropolitana de Belém, no Pará, e 56 nas Ilhas do Combu, para as comunidades Piriquitaquara e Paciência e ainda para a comunidade quilombola África, no município de Moju. As integrantes do Sapato Preto também tiveram projeto aprovado no Fundo Elas – Mulheres em Movimento, em 2019.
Com esse auxílio, o coletivo promoveu rodas de conversas, inclusive com mulheres de outros estados. As integrantes fazem articulações com outras organizações e já pautaram, na Defensora Geral do Estado do Pará, a necessidade de inclusão dos quesitos raça e sexualidade na plataforma de denúncia de violência doméstica — EVA. “Pois precisamos que sejam enumerados dados qualitativos para podermos pleitear políticas públicas voltadas a este público na Assembleia Legislativa e até em nível nacional”, sustenta Darlah.
Para a advogada, apesar do pouco tempo de existência, o Sapato Preto tem muito a comemorar. “A nossa existência já é uma grande Conquista! Ter um coletivo de mulheres negras lésbicas da Amazônia é um símbolo de grande resistência! Nossos passos de fato vêm de Dandara dos Palmares. Nossa revolução é diária e incansável!”, comemora.