Servidores públicos do Executivo federal autodeclarados pretos e pardos recebem salários inferiores em relação aos brancos, apesar de possuírem os mesmos níveis de qualificação profissional e formação em nível superior. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o salário médio para negros com formação completa em universidades representa 78% da remuneração paga aos brancos.
Ainda que os cargos que exigem nível superior geralmente são os de remuneração mais alta, a ocupação desses postos ocorre de forma bastante desigual. A divisão racial desse tipo de vínculo comprova que, embora a participação geral dos negros tenha crescido nos últimos anos, ela tende a se concentrar no escalão mais baixo. Em 2020, 65,1% dos cargos de ensino superior no Executivo federal pertenciam a brancos, enquanto apenas 27,3% eram ocupados por negros.
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“Faz parte do mecanismo do racismo institucional que a população negra seja percebida como aquela que deve estar subalternizada e inferiorizada. O que impede os negros de assumir cargos de liderança. Deste modo, empresas geram menos oportunidades de ascensão às posições superiores. E esse é um motivo que faz com que os salários sejam mais baixos, além do próprio racismo atuando no pagamento”, afirma o advogado Daniel Bento Teixeira, diretor do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert).
O Ceert (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade) realiza censos desde 1990 que mostram dados de diversidade, igualdade e inclusão através de uma análise da população economicamente ativa, tendo em vista os recortes de classe e gênero, além de racial.
De acordo com um estudo da instituição não governamental, dentre os desafios de jovens pretos está a falta de acesso à educação e os critérios excludentes de processos seletivos no mercado de trabalho. Segundo a pesquisa, realizada em 2020, dos 12 milhões de desempregados, 4,36 milhões são jovens negros de faixa etária de 14 a 29 anos, que buscam oportunidades de emprego. Atribuída a análise de disparidade no ensino, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que, enquanto brancos com ensino superior ganham em média R$33,90 por hora, pretos e pardos recebem R$25,50 – uma diferença de 44%.
“O trabalho executado por pessoas negras é pouco valorizado. Justamente pela desumanização dos processos. E, quando estamos defronte a um mercado de trabalho majoritariamente embranquecido, a gente também não encontra tantas oportunidades dentro de empresas que se preocupam com questões raciais, como um dos pilares de promoção de igualdade, e principalmente, de construir relações amistosas entre as pessoas que trabalham nas empresas”, justifica Wellington Lopes, Cientista Social e militante da Uneafro Brasil.
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Presença no ensino superior
Um levantamento do IBGE indica que, entre 2010 e 2019, houve aumento de 400% no número de alunos negros no ensino superior. Dentre os matriculados, estes chegaram a 38,15% do total de ingressantes. O percentual ainda está abaixo de sua representatividade no conjunto populacional de 56% – o que também reflete na baixa inserção do grupo no mercado de trabalho quando exigida a formação em ensino superior.
No país, 65% dos jovens que não estudam ou não concluíram a universidade são negros, segundo o IBGE. A disparidade no ensino afeta diretamente o desempenho no mercado de trabalho. Para o diretor do Ceert, há uma sobrerrepresentação de homens brancos em posições que exigem formação de nível superior.
“Desde o início da minha trajetória universitária entendi que, no momento em que pessoas negras ingressam nesse espaço, elas lidam com a divisão racial. Quase todos os negros que conheço passaram pela escola pública e, geralmente, pessoas brancas da faculdade vêm de famílias com muito dinheiro e são facilmente contratadas, porque sempre têm aquele amigo dos pais que é empresário”, comenta William Cavalcante, estudante de Engenharia de Computação na Universidade de São Paulo (USP).
O estudante conta que teve dificuldade ao tentar acessar às bolsas de iniciação científica, que são destinadas para uma parcela pequena dos universitários. Além disso, os valores oferecidos seriam baixos e insuficientes para quem precisa sobreviver da ajuda de custo.
“Tive uma experiência negativa recentemente em que tentei entrar em uma vaga de estágio do Banco Itaú e só tinha mais uma pessoa negra dentre os sete candidatos. Me senti inseguro e, apesar da bagagem acadêmica que tenho, tive a sensação de estar atrás dos demais. Todos os entrevistadores eram brancos e, apesar de ter a mesma formação que a maioria, nossas trajetórias foram diferentes”, relata William.
Para ele, parte dos universitários negros não conseguem preencher vários pré-requisitos exigidos pelo mercado de trabalho, como cursos de línguas, intercâmbios e experiências extra-curriculares.