Os dados do Censo Demográfico 2022, divulgados nesta sexta-feira (9) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam desigualdades nas condições de vida da população quilombola no Brasil. A maior parte dessa população — 61,7% — vive em áreas rurais. Dentro dos Territórios Quilombolas oficialmente delimitados, esse percentual sobe para 87,37%.
Entre os principais problemas enfrentados, o acesso ao saneamento básico aparece como um dos mais críticos. No total, 94,6% dos quilombolas residentes em áreas rurais convivem com algum tipo de precariedade nesse serviço. Nos territórios oficialmente reconhecidos e localizados em áreas rurais, o índice é de 93,8%.
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Essas precariedades incluem abastecimento de água inadequado, ausência ou insuficiência de coleta de lixo e formas precárias de destinação do esgoto. Em um terço dos domicílios quilombolas rurais (33,2%), as três carências ocorrem simultaneamente. Para efeito de comparação, esse cenário atinge apenas 3% da população brasileira como um todo.
Saneamento básico e acesso à água
Os indicadores mostram níveis extremos de privação em serviços essenciais. Apenas 72,3% dos moradores de territórios quilombolas rurais têm banheiro de uso exclusivo no domicílio. Outros 7% não possuem sequer buracos para dejeções, evidenciando prática de defecação a céu aberto.
Quanto ao abastecimento de água, apenas 28,5% dos moradores em territórios rurais acessam a rede geral. A maioria depende de poços profundos, fontes naturais ou alternativas como carro-pipa e água da chuva. O acesso em condições precárias atinge 41,6% dos moradores em territórios rurais, valor significativamente superior à média nacional rural de 29,3%.
O esgotamento sanitário também revela disparidades: 83,3% dos quilombolas rurais utilizam fossas rudimentares, buracos ou não possuem nenhum tipo de escoamento. No Brasil rural, esse índice é de 75,3%. A coleta de lixo, mesmo em áreas urbanas, é limitada. Nos territórios em situação urbana, 14,3% da população quilombola não conta com nenhum tipo de coleta — proporção dez vezes superior à registrada na população urbana em geral (1,4%).
Distribuição e perfil demográfico
A população quilombola no Brasil soma 1.330.186 pessoas, das quais 61,7% vivem em áreas rurais. Dentro dos Territórios Quilombolas, esse índice sobe para 87,37%. Os dados mostram que essa população apresenta um perfil mais jovem em comparação com a média nacional. Em territórios rurais, 52,98% têm até 29 anos, com idade mediana de 27 anos — inferior à mediana de 35 anos da população total do país.
A composição dos domicílios revela que 61% das unidades com presença quilombola contam com responsável e cônjuge. Em 50% dos casos, a pessoa responsável é do sexo feminino, com predominância feminina maior nas áreas urbanas e masculina nas áreas rurais.
Educação e analfabetismo
A taxa de analfabetismo entre quilombolas em áreas rurais é de 22,7%, enquanto nas áreas urbanas esse índice cai para 13,3%. Os dados indicam que, mesmo dentro de territórios oficialmente reconhecidos, a taxa de alfabetização (79,7%) está abaixo da média nacional (93%). As taxas de analfabetismo são maiores entre os homens e se acentuam fora dos territórios, tanto em áreas urbanas quanto rurais.
Os pesquisadores associam a presença de programas de educação de jovens e adultos e a valorização das escolas comunitárias como fatores que elevam ligeiramente a alfabetização nos territórios, embora os números permaneçam distantes dos índices nacionais.
Mortalidade e desigualdades estruturais
O levantamento identificou 10.230 óbitos em domicílios com ao menos um morador quilombola entre agosto de 2021 e julho de 2022. A mortalidade infantil mostrou-se mais elevada do que na média da população nacional. Entre crianças com menos de um ano, a participação nos óbitos registrados foi de 3,3% nos domicílios quilombolas, ante 1,7% na população geral.
Dados sobre sobremortalidade — taxa de mortalidade superior à esperada para um determinado grupo populacional — masculina também chamaram atenção. Entre jovens de 20 a 24 anos, o número de óbitos masculinos foi cinco vezes maior que o de mulheres, possivelmente devido a causas externas como violência, acidentes e suicídios.