O técnico de enfermagem João Luiz da Silva Oliveira, de 34 anos, vai ser julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro por conta de um crime que aconteceu no bairro de Belmonte, em Queimados (RJ), enquanto ele trabalhava em um hospital em Belford Roxo (RJ). Ele já ficou por preso nove dias, em setembro do ano passado, e mesmo com álibi, falhas no inquérito e a vítima não tê-lo reconhecido pessoalmente, dois processos seguem em tramitação, um pedido de prisão foi emitido e o caso deve chegar ao STJ (Superior Tribunal de Justiça).
“A família está abalada. É mais de um ano de sofrimento, despesas e preocupações para todos”, lamenta Fernanda Oliveira, irmã de João. A sucessão de erros no caso, segundo a família, é alarmante e expõe um viés racial no filtro da Justiça. “Não é possível acreditar que não é racismo. A cor da pele foi o que levou ele à prisão”, continua a irmã.
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O assalto à mão armada teria acontecido no dia 2 de março, há 14 meses atrás, no bairro de Belmonte, em Queimados, por volta das 21h, cidade onde João mora. Os suspeitos seriam uma dupla que roubaram dinheiro e celulares das vítimas. Um outro crime com características semelhantes foi cometido na mesma noite por duas pessoas numa moto, em Nova Iguaçu, também na Baixada Fluminense, que assaltaram um casal que estava no ponto de ônibus.
No dia 2 de setembro de 2021, João foi até o 55º DP, em Queimados, para atender uma intimação judicial achando que iria receber informações sobre seu celular furtado no começo do mesmo ano. No entanto, ele foi preso ao chegar na delegacia porque um juiz tinha expedido o pedido de prisão com base em imagens da rede social.
Na audiência de custódia, que aconteceu rapidamente no dia 4 de setembro, um sábado, a prisão de João foi confirmada, mesmo sem outras provas contra ele, que nunca tinha sido preso e tinha um álibi – ele estava a 12km de distância do local dos assaltos fazendo plantão no hospital.
O trabalhador ficou preso entre 2 e 10 de setembro de 2021. No dia 8, após dias de protestos da família e mobilização nas redes sociais, que apontavam os erros do processo, a justiça emitiu um habeas corpus, porém, ainda levou dois dias para ele sair da cadeia porque o documento foi enviado para o presídio errado.
“Além das provas de inocência em favor do João, a própria vítima do roubo não o reconheceu pessoalmente”, explica Stephanie Corrêa, advogada dele.
De acordo com ela, o que levou João à prisão e ainda pode gerar prejuízos para ele foi o uso de várias imagens dele, retiradas de redes sociais. Esse reconhecimento por foto foi feito no dia 2 de junho, três meses depois do assalto.
“É um caso de flagrante ilegalidade e mesmo com provas contundentes da inocência, ele continua respondendo a processos e pode ser preso. No reconhecimento fotográfico, a foto dele no livro de suspeitos já se destacava das outras porque ele estava fazendo pose e sorrindo, eram imagens retiradas das redes sociais, enquanto as fotos dos outros suspeitos apresentadas para a vítimas eram de documentos oficiais ou fotos tiradas na própria delegacia”, lembra a advogada.
Corrêa pontua também que no dia do assalto a vítima não tinha feito a descrição do suspeito, a identificação foi feita por foto apenas em junho. “Na delegacia, apresentaram para a vítima mais de uma foto do João e a todo o momento se referiam a ele como criminoso, com frases do tipo ‘você não reconhece este criminoso’. Isso induziu o reconhecimento feito pela vítima”, diz.
João foi solto após nove dias de prisão, mas ainda é processado | Imagem: Arquivo da família
As investigações da polícia apontam o João como suspeito nos dois crimes, o de Nova Iguaçu e o de Queimados. No assalto de Nova Iguaçu, uma das vítima disse que não tinha condições de reconhecer os assaltantes porque o local estava mal iluminado. Já a outra reconheceu João por foto no primeiro momento, mas temos depois afirmou não reconhecê-lo. Mesmo assim, foi expedido um novo pedido de prisão. Já no caso de Queimados, o único reconhecimento foi feito por foto, usando as imagens da rede social.