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Afrofuturismo: “Nós somos a tecnologia”, afirma poeta Saul Williams

8 de novembro de 2018

Em entrevista concedida ao Alma Preta durante a Festa Literária das Periferias (FLUP), o escritor norte-americano, Saul Williams, e o artista camarones, Bonaventuré Ndikung, contaram as suas impressões sobre o afrofuturismo

Texto / Pedro Borges
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O Afrofuturismo é um movimento cultural com repercussão e popularidade recente no Brasil. O filme Pantera Negra, sucesso de bilheteria em Hollywood, é uma representação clássica do movimento que reúne a ancestralidade africana e projeções futuras repletas de tecnologia para a comunidade negra.

O tema foi o assunto da mesa de debate “Renascença Sankofa”, que ocorreu no Parque Biblioteca Estadual, na Pequena África, Rio de Janeiro, durante a 7° edição da Festa Literária das Periferias (FLUP). O diálogo, que se iniciou às 18h, contou com a presença do poeta americano Saul Williams, do artista camarones Bonaventuré Ndikung, com a mediação do ator e MC, Eugênio Lima.

O poeta norte-americano, músico e ator no musical sobre a vida de Tupac, “Holler if ya hear me”, acredita que a comunidade negra tenha uma relação bastante intrínseca com a tecnologia.

“Tecnologia é muito relacionada a gente. A primeira tecnologia do mundo industrial foram máquinas criadas para nos substituir na escravidão, não porque estavam preocupados conosco, mas porque queriam aumentar a produção”, afirma Saul Williams.

Saul Williams acredita que as comunidades negra e indígena são o futuro de toda a humanidade. Tecnologias utilizadas no passado, sem a produção de lixo, por exemplo, são as possibilidades de se construir um futuro.

“Os mesmos processos que o movimento ecológico têm proposto, africanos e indígenas já faziam, como reciclar, não desperdiçar e não produzir lixo”.

Por isso, diz não se espantar com o sucesso do afrofuturismo.

“Eu acho natural o nosso interesse na tecnologia, porque nós somos a tecnologia do mundo. É isso o que africanos e indígenas têm sido para o mundo. Nosso povo, que seguia as estrelas no passado, talvez siga outras estrelas para encontrar um lugar diferente desse”.

O movimento afrofuturista remonta da década de 1960, nas letras do compositor de Jazz e poeta, Sun Ra, que se descrevia como “filósofo cósmico” e ser de outro planeta. O termo só foi utilizado, porém, pela primeira vez em 1994, em ensaio publicado pelo escritor Mark Dery, sobre a ausência negra na ficção científica do Século XX.

Na literatura, a principal expressão do gênero é a escritora Octavia Butler, primeira mulher negra a ganhar destaque no campo da ficção científica. O romance “Kindred”, publicado em 1979, conta a história de uma mulher negra da década de 1970, que volta no tempo e passa a viver o cotidiano das sociedades escravistas. Ela passa a conviver com seus antepassados e a lutar pela sobrevivência de todos, para que ela tenha condições de nascer, no futuro.

Outras referências são possíveis

O camaronês Bonaventure Ndikung, diretor do centro cultural SAVVY Contemporary, em Berlim, e editor-chefe da revista SAVVY, a primeira revista on-line sobre arte contemporânea africana, porém, acredita que o termo não representa toda diáspora ou mesmo a população do continente africano.

“Eu não sou um grande fã do afrofuturismo. Eu imagino que isso seja importante para certas pessoas na diáspora, especialmente como espaço para imaginação. Eu também acho que a diáspora africana é complexa e existem várias diásporas”, conta.

Ele acredita que o termo é uma contradição, por reunir as palavras “afro” e fazer uma menção ao movimento “futurista”.

“Ter afro sobre o futurismo já é algo problemático. Marinetti e o movimento futurista se aproximaram do fascismo. Isso é problemático para mim. Eu acho que é importante para muitas pessoas, e eu acho que a gente também precisa de novos termos, noções e palavras”.

O movimento futurista veio a público em 20 de Fevereiro de 1909, com o lançamento do Manifesto Futurista, no jornal Le Figaro, pelo poeta italiano Felippo Tommaso Marinetti. O movimento se caracterizou por refutar referências do passado, celebrar o progresso, a tecnologia, a velocidade e a vida urbana.

Marinetti tinha uma admiração pela guerra e pelas ideias de Benito Mussolini, ditador italiano. O poeta participou da reunião de fundação do grupo fascista de Mussolini em 23 de Março, de 1919, em Milão. Declarou apoio a Mussolini, chegou a ser preso com o ditador em 1920, e acreditava que o fascismo representava o futurismo. Quando morreu, e 2 de Dezembro de 1944, Mussolini ordenou um funeral digno de chefe de Estado.

Para ele, seria mais interessante se construíssemos novos termos, que dialogassem mais com nossos referenciais.

“Nós temos alguns espaços mais importantes para mim. Rituais, transformações entre homens e animais, mediums, o poder de falar com os mortos. Para mim, esses espaços são mais importantes, interessantes, e não acho que poderiam ser reduzidos ao futurismo ou ao afrofuturismo. Eu não acho que nós precisamos pegar uma referência, que na verdade é contrária a nós”, conclui Bonaventure Ndikung.

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