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Obra “Deus é Mãe” sofre tentativa de criminalização em Belo Horizonte, apontam artistas

FESTIVAL CURA 2020 - Circuito Urbanos de Arte 

Artista Robinho Santana. 

Foto: Caio Flavio / Área de Serviço

Insta: @cf_drones_bh / @area.de.servico

— FESTIVAL CURA 2020 - Circuito Urbanos de Arte Artista Robinho Santana. Foto: Caio Flavio / Área de Serviço Insta: @cf_drones_bh / @area.de.servico

2 de fevereiro de 2021

Grafite feito pelo artista Robinho Santana usa tipografia inspirada no “pixo”; Polícia Civil de Minas Gerais diz que é crime ambiental

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões I Imagem: Caio Flávio/CURA

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A equipe de organização da mostra CURA (Circuito Urbano de Arte), em Belo Horizonte, foi surpreendida com uma investigação da Polícia Civil de Minas Gerais, que acusa uma das obras de crime ambiental. Segundo os responsáveis pela exposição, a notificação para que patrocinadores, organizadores e artistas prestasssem depoimento causou constrangimento, pois se trata da quinta edição e os convidados receberam um cachê para a produção dos murais.

A obra que gerou a investigação policial se chama “Deus é Mãe” e retrata três figuras negras, uma mulher, uma criança de colo e uma outra criança um pouco maior. A arte é de autoria do grafiteiro paulista Robinho Santana.

O painel tem mais de 2 mil metros quadrados e está em uma empena (lateral de prédio sem janelas) na capital mineira. A moldura do desenho, sobre um fundo amarelo, é composta por inscrições que usam a tipografia do “pixo”, simbolizando a linguagem da pixação.

“É uma questão estética, não configura pixação. Foram artistas convidados com autorização. É uma estética vinda da periferia, da cultura do hip-hop e do grafite, que são oriundos da cultura negra. É óbvio que a elite e a burguesia não aceitam a estética da periferia. O que está acontecendo é uma espécie de juízo de valor, uma curadoria não autorizada da polícia, de belo e de feio”, diz Priscila Amoni, organizadora da CURA.

Priscila reafirma que essa tentativa de intervenção é uma face do racismo estrutural, principalmente em Minas Gerais, onde o racismo é bastante presente desde o período da escravidão. “A gente não vai aceitar que esse recurso [abrir inquérito para incriminar os artistas] seja uma ferramenta de racismo do Estado para perseguir jovens negros da periferia”, comenta.

À agência Alma Preta, o autor da obra diz que o conceito do painel é integrar diversos tipos de manifestações artísticas e de linguagem. “Eles estão separando o que é pixação e o que é pintura, sendo que é uma coisa só, desde o início. Se fosse um outro tipo de letra ou tipografia de algum outro país, essa perseguição não existiria”, argumenta Robinho Santana.

Pelo crime de pixação, enquadrado nas leis de proteção ambiental, o artista e a organização do CURA podem ser condenados a até quatro anos de prisão. Para o artista plástico e grafiteiro Rafael Rasmoke existe um projeto de criminalização e censura da arte. “A obra traz um exemplo da simbologia da pixação não é o ato em si. O pixador quando busca demarcar uma parede com o seu protesto e sua mensagem, faz isso de forma totalmente ilegal, para que tenha a força do protesto e o impacto da indignação. É quase que um grito”, afirma.

A estética do pixo em si tem reverberado em diversas outras plataformas como estampas de camisetas, marcas, lojas e artigos de luxo. “A pixação, como estética e tipografia, tem espaço cada vez maior em grandes galerias no Brasil e no exterior”, completa Rasmoke.

Os organizadores da CURA entraram com um pedido na Justiça para barrar a investigação. Em nota, a Polícia Civil de Minas Gerais informou à reportagem que o inquérito policial segue sob sigilo na DEMA (Delegacia Especializada em Investigação de Crimes contra o Meio Ambiente) e que mais informações sobre o caso serão divulgadas “em momento oportuno”.

A polícia não quis comentar quais foram os motivos que levaram à abertura do inquérito e se houve racismo ou tentativa de criminalizar a cultura periférica. Para fazer o mural na 5ª edição do CURA, Robinho Santana contou com a colaboração dos artistas Poter, Lmb, Bani, Tek e Zoto, todos de Belo Horizonte.

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