A reforma eleitoral, já aprovada pelo plenário do Senado no primeiro semestre de 2021, altera a legislação política em vários aspectos diferentes. No momento, a alteração tramita na Câmara dos Deputados e aguarda parecer favorável. Para entrar em vigor nas próximas eleições, em 2022, é necessário que sua aprovação na casa aconteça até outubro deste ano.
Os parlamentares Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR) e Soraya Santos (PL-RJ) protocolaram um projeto de lei complementar que faz uma reformulação em toda a legislação partidária e eleitoral. No entanto, o texto não prevê reserva de recursos para candidaturas de negros e mulheres e, sim, a criação de um novo Código Eleitoral, que unifica normas encontradas em outras legislações, como a Lei dos Partidos, a Lei das Eleições, o Código Eleitoral e a Lei da Inelegibilidade.
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Nesta quarta-feira (4), a Coalizão Negra por Direitos realizou um ato em protesto à reforma eleitoral. A manifestação aconteceu no Salão Verde, da Câmara de Deputados, e foi intitulada como a campanha “Reforma Racista Não”. Além dos ativistas da Coalizão, parlamentares de esquerda marcaram presença e discursaram a favor da igualdade racial e de gênero na democracia brasileira.
Em entrevista à Alma Preta Jornalismo, o deputado federal Bira do Pindaré (PSB), um dos apoiadores da campanha, afirmou ser muito importante a iniciativa da Coalizão Negra por Direitos. O parlamentar aponta que a reforma eleitoral deve ter seus pilares apoiados na luta antirracista e também se posicionar contra o machismo.
“Nesse sentido, me posiciono favorável às ideias, a fim de que a gente possa ter representatividade no parlamento brasileiro daquilo que nós somos, enquanto sociedade plural e diversa, que traz em sua história a marca e a luta do povo negro”, ressalta.
O deputado Bira do Pindaré ainda relata que se sente discriminado na câmara, “porque de 513 deputados, nós temos apenas 20 pretos e pretas. É uma sub-representação de uma parcela da sociedade que é majoritária. Portanto, é preciso reverter e corrigir essa grave distorção histórica que alimenta o racismo estrutural e institucional no Brasil”, coloca o parlamentar.
O que muda com a reforma eleitoral
“O pacote altera o sistema eleitoral brasileiro e, entre outros retrocessos, ignora totalmente o recorte racial. Ele traz o voto impresso como obrigatório, o voto de legenda por meio do distritão, além de limitar o percentual de cota para candidaturas de mulheres – indicando que não deve haver aumento na representatividade feminina”, diz a Coalizão sobre um dos pontos da reforma.
Além disso, a reforma eleitoral aborda outros assuntos, como as vagas em eleições proporcionais. O PL 783/2021, de autoria do senador Carlos Fávaro (PSD-MT), determina que só poderão participar da distribuição de vagas não preenchidas os partidos que alcancem a cláusula de desempenho, imposta pela Emenda Constitucional (EC) 97, de 2017, que veda coligações partidárias nas eleições, estabelecendo normas sobre o acesso dos partidos políticos para a obtenção de recursos do fundo partidário e tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão.
O projeto também sugere o fim do sistema próprio da Justiça Eleitoral, ou seja, a apresentação de documentos relacionados poderá ser realizada por meio do sistema da Receita Federal, não mais pelo modelo atualmente usado pela Justiça Eleitoral. Além disso, diminui o prazo da Justiça Eleitoral de cinco para dois anos para levantamento de prestação de contas dos partidos, “sob pena de extinção do processo”.
O crime de caixa dois também é citado em um dos textos. A infração significa doar, receber, ter em depósito ou utilizar, de qualquer modo, nas campanhas eleitorais ou para fins de campanha eleitoral, recursos financeiros fora das hipóteses da legislação. No entanto, com a reforma eleitoral, a Justiça poderá deixar de aplicar a pena se a omissão ou irregularidade na prestação de contas for de valores baixos
Pela a reforma eleitoral, as pesquisas realizadas em data anterior ao dia das eleições só poderão ser divulgadas até a antevéspera da votação. No caso de pesquisas sobre intenção de voto, realizadas na data exata das eleições, a divulgação só será permitida, no caso de presidente da República, após o horário previsto para encerramento da votação em todo território nacional.
Ainda sobre as pesquisas, as mudanças propostas exigem que o Ministério Público, partidos políticos e coligações peçam à Justiça Eleitoral acesso ao sistema interno de controle das pesquisas de opinião divulgadas para que confiram os dados publicados. No caso de a Justiça autorizar, o interessado poderá ter acesso ao modelo de questionário aplicado.
Protesto conta com apoio de parlamentares e dá margem à cobrança popular
Os principais pontos levantados no protesto liderado pela Coalizão contra a reforma eleitoral foram: ampliação da participação negra e popular nos espaços de poder; paridade da representação negra na política com acesso proporcional ao fundo partidário, ao tempo de propaganda partidária, bem como cotas de candidaturas e mandatos negros; 50% de candidatas e representantes mulheres nas casas legislativas; não ao voto impresso; e reforma eleitoral discutida com a sociedade civil organizada.
“Em um país com 56% de população negra e 51,5% de mulheres, é inaceitável que o Congresso aprove essa reforma eleitoral. Estão buscando apenas privilegiar candidaturas com mais estrutura financeira e de poder. Com essa reforma, o número de deputados e senadores brancos, homens, mais velhos e ricos aumentará”, declarou a Coalizão por meio de nota.
As deputadas federais Talíria Petrone, do PSOL, e Benedita da Silva (PT), entre outros parlamentares, como Marcelo Freixo (PSB) marcaram presença em apoio ao ato, que lançou o portal “Reforma Racista Não”.
“No site da campanha será possível pressionar os parlamentares para que o racismo eleitoral presente nesta proposta de reforma não ocorra e que o legislativo considere a importância dos avanços nas políticas públicas que os movimentos negro e de mulheres conquistaram ao longo das últimas décadas”, diz a nota da Coalizão.
Apoiados na frase “enquanto houver racismo, não haverá democracia”, os presentes prestaram seu apoio à campanha, inclusive lideranças do Movimento Negro, como Douglas Belchior e Vilma Reis.
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