Pesquisar
Close this search box.

“Não admitirei atos racistas”, diz Milton Leite, presidente da Câmara de São Paulo

Em entrevista à Alma Preta, o vereador, que está no sétimo mandato consecutivo, considera que é importante explicar o contexto dos monumentos racistas e causar reflexão, "mas sem apagar a memória"

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nadine Nascimento I Imagem: Câmara dos Vereadores

milton leite, vereador negro, presidente da câmara dos vereadores

13 de agosto de 2021

A cidade de São Paulo, que tem mais de 12 milhões de habitantes, passa pelo 54º mandato de prefeito e está na 18ª legislatura da Câmara dos Vereadores. As ações afirmativas para a população negra, que são 37% dos paulistanos, e o combate ao racismo são medidas que passam pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) e pelo presidente da Câmara, o vereador Milton Leite (DEM), que é negro.

Em entrevista exclusiva para a Alma Preta Jornalismo, o presidente da Câmara disse que não é possível tolerar atos e falas racistas e contou qual é a agenda antirracista e de promoção da igualdade racial da Casa.

Quer receber nossa newsletter?

Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!

Leite, que é empresário, falou também sobre as homenagem que existem na cidade para figuras históricas escravocratas e que participaram do genocídio dos povos indígenas e da população negra do país.

Nas eleições de 2020, na disputa para o sétimo mandato consecutivo de vereador, Leite gastou R$ 2,5 milhões na campanha e conseguiu 132 mil votos. Ele foi o segundo mais votado, ficando atrás apenas do vereador Eduardo Suplicy (PT), que recebeu 167 mil votos e gastou R$ 207 mil.

Antes de virar vereador, Leite organizou mutirões de habitação na zona Sul onde cresceu e começou a trabalhar bem jovem, entregando pão de casa em casa.

Alma Preta Jornalismo (APJ): Quais os desafios da cidade e da Câmara no combate ao racismo estrutural?

Milton Leite (ML): Vejo muitos desafios e, por outro lado, muitos avanços também. Quando um vereador, durante uma sessão, diz uma frase racista e imediatamente é repudiado por todos os colegas independentemente do partido ou ideologia, isso mostra que a sociedade está alerta. Porque o plenário da Câmara nada mais é do que o retrato da nossa sociedade.

APJ: Quais os projetos e programas de políticas afirmativas e promoção de igualdade racial que a câmara apoia e incentiva?

ML: Assim que assumi a presidência da Câmara, no início do ano, afirmei e dei as garantias de que a Casa é ambiente absolutamente livre de preconceitos, sejam eles de qualquer tipo. Temos um Projeto de Resolução que cria a Frente Parlamentar de Combate ao Racismo, de autoria da vereadora Luana Alves do PSOL, que está tramitando na Casa. Eu acho importante também, na medida em que sou responsável pela mediação dos debates, garantir a plena igualdade e o direito do uso da tribuna a todos. Isto é demonstração de que na Câmara jamais haverá distinção alguma entre negros e brancos.

APJ: Qual a agenda de promoção de igualdade racial que o vereador gostaria de ver implantada na cidade?

ML: O estabelecimento da agenda depende de políticas públicas efetivas desenvolvidas pela prefeitura municipal, e o prefeito Ricardo Nunes é um homem público muito consciente em relação ao tema. Posso falar da parte do Legislativo paulistano que, por meio dos Projetos de Lei aprovados, estimulam a igualdade social e, consequentemente, racial. Já que as duas estão fortemente conectadas. Um exemplo é o Projeto de Lei “Pode Entrar”, que impulsiona a construção de habitações populares. Uma demanda que chegou diretamente dos movimentos sociais, como o Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto, e foi prontamente apreciada e aprovada pelos vereadores.

APJ: Por que temos tão poucos vereadores negros na atual legislatura e na história da Câmara dos Vereadores?

ML: É muito triste isso. Como negro que sou, confesso que o conjunto de dificuldades que vivemos ao longo do caminho pode ter dificultado muitos de estarem aqui.

APJ: Como o senhor se posiciona, pessoalmente, sobre o caso do uso da expressão “negro de alma branca” em discurso do plenário?

ML: Não admito e não admitirei falas racistas durante as sessões que presido. Disse isso durante o episódio em junho e reafirmo hoje e quantas vezes forem necessárias.

APJ: Infelizmente, o racismo explícito e velado está no cotidiano da cidade, o que fazer sobre isso?

ML: Denunciar sempre. Não admitir, se indignar. Muitas vezes as pessoas falam frases racistas sem ao menos perceber que são racistas, isso precisa acabar.

APJ: Como um político negro de uma base eleitoral periférica, como o senhor vê tantas casos de racismo e discriminação racial que acontecem na cidade, sobretudo nas áreas nobres?

ML: Eu vejo com muita tristeza e indignação. Por outro lado, me orgulho de lembrar que no dia 1 de janeiro deste ano a Câmara Municipal de São Paulo teve duas candidaturas negras à presidência: eu e a vereadora Erika Hilton, do PSOL. Na medida em que o negro ocupa a tribuna do maior parlamento da América Latina, mostramos que o lugar dele é também nos postos de decisão importante e de poder.

APJ: Outro ponto em questão atualmente é a simbologia que existe na cidade de São Paulo que faz homenagem a escravocratas e figuras que tiveram ações racista. Tem no Bom Retiro, por exemplo, uma rua chamada Jorge Velho, que foi um mercenário contratado para atacar e destruir o quilombo dos Palmares. Como é possível fazer um debate público e amplo sobre os nomes de ruas, estátuas e praças da cidade?

ML: O debate se faz com informação, na minha opinião. Muitas pessoas não sabem quem foram os homenageados nestas estátuas, se foram bons ou ruins. É importante explicar quem estas pessoas foram; mas sem apagar a memória. Aí, sim, provocaremos uma reflexão.

Leia Mais

Destaques

AudioVisual

Podcast

papo-preto-logo

Cotidiano