Defensores de políticas voltadas para grupos minorizados, eles relatam que falta de investimento dos partidos foi o maior empecilho para o sustento de suas campanhas
Texto: Roberta Camargo | Edição: Nataly Simões | Imagem: Acervo Pessoal/Keit Lima
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Passado o primeiro turno das eleições municipais, o Brasil se deparou com um número que representa esperança para os grupos minorizados, o de que negros serão 44% dos vereadores nas câmaras municipais em 2021. Numa eleição marcada pela mudança no perfil racial de parte das pessoas que ocuparão esses espaços, há ainda aqueles candidatos que fizeram campanhas voltadas para as populações das periferias, com propostas de transformações sociais, e que angariaram um bom número de votos nas urnas, mas não conseguiram se eleger.
Todos os candidatos que concorrem a uma cadeira para vereador são aptos a serem suplentes dos eleitos. Isso significa que na linha de sucessão do vereador eleito, os que receberam mais votos e mesmo assim não foram eleitos automaticamente podem fazer parte da Câmara Municipal caso o candidato eleito da sigla precise sair e, em caso de empate de votos, quem assume é o suplente mais velho.
Keit Lima, do PSOL, e Raphael Shouz, do PDT, são dois exemplos de candidatos que não conseguiram alcançar o número de votos suficientes para assumir uma cadeira na Câmara Municipal de São Paulo. A distribuição de verba feita de forma desigual dentro dos partidos, para os dois candidatos, foi o maior empecilho para sustentar suas campanhas.
“A gente tinha boas ideias e engajamento da comunidade, mas faltou verba para conseguirmos estar em mais lugares. O partido investiu R$ 2 mil em mim, sendo que teve gente que recebeu R$ 20 mil”, conta Shouz.
O diálogo com o PDT, para tornar a disputa mais igualitária nas próximas corridas eleitorais faz parte das pautas defendidas por ele. Shouz conta que absorveu todas as funções da campanha para si, desde a edição dos vídeos até a divulgação do conteúdo. “Eu não consegui capitalizar os recursos e isso foi falha minha e do partido”, avalia.
Integrante de uma das maiores organizações do movimento negro brasileiro, a Educafro, Keit, que alcançou mais de 11 mil votos na capital paulista, relata que sua situação foi semelhante a de Shouz, com pouca verba de campanha.
“Todas as pessoas que subiram receberam mais de R$ 45 mil, eu fui a única que recebeu quase cinco vezes menos, com R$ 9 mil, explica a candidata que faz parte do movimentos sociais desde a juventude e se posicionou para cobrar o PSOL pela disparidade entre o financiamento de diferentes candidatos. “Não se faz campanha sem dinheiro”, complementa.
O pleito de 2020 ficou conhecido também como o primeiro em que passou a valer a decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de que os partidos deveriam distribuir os recursos eleitorais de maneira proporcional para candidaturas negras. No início de novembro, organizações do movimento negro denunciaram que as siglas não estavam cumprindo com a distribuição e cobraram mais transparência no processo.
Rafael Shouz foi candidato a vereador na cidade de São Paulo. Foto: Acervo Pessoal
A luta continua
Mesmo com a falta de investimento dos partidos em suas candidaturas, Keit Lima e Rafael Shouz pretendem se manter ativos na política – que não é feita apenas dentro dos espaços institucionais, e já de olho nas eleições de 2022.
“Eu não construo o partido, eu construo o movimento negro, a periferia e as mulheres. São as mulheres pretas que levam a esquerda pra esquerda. Em 2022, eu vou estar nessa disputa e vou seguir dentro do meu partido, inclusive escancarando a incoerência deles”, revela Keit.
Shouz diz que vai manter seus projetos ativos nas periferias, utilizando o período e a experiência que teve concorrendo como vereador para criação de projetos de conscientização sobre as desigualdades. “Tive muita gente me apoiando pelas pautas que eu trago de cultura e de trabalho. Isso tudo me fez ter mais fôlego pra não desistir”, conclui.