Johan Magufuli recomenda orações, faz testes falsos e é acusado por agências internacionais de omitir dados sobre a doença
Texto / Guilherme Soares Dias | Edição / Nataly Simões | Imagem / DW/E.Boniphace
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Desde que começou a pandemia do Covid-19, o novo coronavírus, o presidente da Tanzânia, John Magufuli, tem tratado o assunto de forma peculiar, minimizando os impactos e a necessidade de se preocupar com a doença e o isolamento social, assim como ocorre com o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro.
No último 19 de maio, Magufuli enviou amostras de frutas e animais com nomes de seres humanos para o laboratório nacional de testes do coronavírus. O envio, segundo ele, seria para comprovar “falsos positivos” e questionar a credibilidade dos locais. Segundo o presidente, as amostras enviadas obtiveram resultados positivos e ele chegou a ordenar a demissão do chefe do laboratório nacional. “Sempre levantei minhas suspeitas sobre como nosso laboratório nacional conduz os casos da Covid-19”, disse.
Em um vídeo, o presidente chegou a comentar que remédios naturais ajudaram seu filho a se curar da doença. “Meu próprio filho, depois de contrair o vírus, fechou-se em seu quarto, tomou uma solução de limão e gengibre antes de melhorar e é capaz de fazer flexões”, informou o The Guardian. O presidente chegou a pedir que a população rezasse para combater o vírus porque a doença “não pode sobreviver no corpo de Cristo”, incentivando as pessoas a comparecerem nos cultos de suas igrejas e mesquitas, insistindo que as orações “podem vencer” o vírus que ele denomina como “satânico”.
Magufuli também disse que a economia era mais importante do que a doença. “Tivemos várias doenças virais, incluindo Aids e Sarampo. Nossa economia deve vir em primeiro lugar. Não deve dormir. Se permitirmos que nossa economia durma, não receberemos salários. A vida deve continuar”, acrescentou o presidente.
Segundo a contagem da Universidade Johns Hopkins, o país da África Oriental, que possui 55 milhões de pessoas, tem 509 casos oficiais e 21 mortes em decorrência do novo coronavírus, ocupando o 121º lugar na lista dos mais atingidos. Apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS) criticar o país pela contínua falta de cooperação e transparência na luta global contra a pandemia da Covid-19, o presidente John Magufuli já afirmou que o país venceu a doença e fez isso apenas com o auxílio da fé e orações.
No entanto, de acordo com a agência Associated Press, a situação está longe do controle na Tanzânia. A agência aponta falta de transparência nos dados e perseguição do atual governo a quem questiona ou critica ações de combate ao novo coronavírus. Um dos pontos que fizeram as agências internacionais suspeitarem da garantia dos dados divulgados pelo governo foi a ausência de modificações de novos casos da doença ao longo das últimas três semanas. Alguns opositores disseram que seus celulares foram grampeados e que temem dar informações sobre o que realmente ocorre sob o comando de Magufuli.
Outro ponto criticado é a postura do presidente em relação aos especialistas em Saúde do governo. Mais uma vez, Magufuli demitiu o responsável por agrupar e divulgar os dados da doença. Além disso, tem se mostrado contrário ao uso de normas de distanciamento social, ressaltando que a economia é a prioridade – outro ponto em comum com o presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
Perfil
O jornal El País descreve John Magufuli, de 60 anos, como professor de Matemática, que se doutorou em Química na Universidade de Dar es Salaam e chegou a ser ministro de Obras Públicas. Quando se candidatou à presidência da Tansânia em 2015, ele não era vinculado às altas esferas do partido governamental. O seu lema na campanha foi “trabalho, trabalho e trabalho”.
Católico fervoroso, Magufuli ganhou a fama de incorruptível e o apelido de Tingatinga (“trator” em suaíli), por distribuir rodovias e outras obras de infraestrutura pelo país. Já como presidente, levantou a bandeira da luta contra o absentismo trabalhista, a corrupção e o desperdício de dinheiro público. Proibiu as viagens ao exterior dos altos funcionários do governo que não fossem devidamente justificadas.
O presidente da Tanzânia também passou a combater toda a oposição e vozes dissidentes da imprensa livre. De acordo com a Anistia Internacional, três jornais, seis redes de TV e 21 emissoras de rádio foram fechados por decreto, e dirigentes políticos presos e julgados por crime de incitação ao ódio.