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‘Pedagogia do Ebó’: livro de antropóloga negra traz novo olhar sobre educação com saberes ancestrais

Livro da antropóloga Beatriz Martins Moura fala do processo enriquecedor de trocas entre mulheres de terreiros e universidades
Imagem mostra Beatriz, a antropóloga autora do livro. Ela é uma mulher negra de pele clara, tem cabelos cacheados e loiros soltos, sorri e veste uma blusa social branca. Atrás dela há uma estante de livros.

Foto: Bárbara Vale

20 de março de 2024

O livro “Pedagogia do Ebó”, publicado pela editora Appris, defende uma sala de aula acolhedora e plural. A autora é a doutora em antropologia social pela Universidade de Brasília (UnB) Beatriz Martins Moura, que, como indica o subtítulo da obra, busca “horizontes possíveis para a universidade a partir de mulheres de axé”.

O livro nasceu através da troca de experiências da autora com Mãe Dora de Oyá e Makota Kidoiale nos terreiros e nas universidades onde atuaram como professoras, no projeto Encontro de Saberes. O lançamento será no dia 26 de março, às 19h30, com bate-papo da autora e Mãe Dora de Oyá na Livraria da Vila, em Brasília (DF).

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“A proposta do livro é apresentar uma nova maneira de construir conhecimento e de se relacionar nas salas de aula universitárias a partir do que chamo de Pedagogia do Ebó. O conceito fala sobre o modo que mulheres de axé estabelecem relações de ensinar e aprender e elaboram metodologias que se ancoram nos conhecimentos das comunidades tradicionais de terreiro, promovendo transformações na academia”, diz a antropóloga, que também é coordenadora de Educação para a Igualdade do Ministério das Mulheres.

Para a autora, as discriminações contra as religiões de matriz africana são os principais desafios a serem enfrentados.

“A reprodução de estereótipos e de preconceitos permanece. Há um lastro de perseguições às quais essas religiões estão submetidas desde o período escravocrata. A intolerância e o racismo impactam no modo como, muitas vezes, essas comunidades não são reconhecidas como produtoras de conhecimento, afirma.

A antropóloga explica que “Pedagogia do Ebó” traz uma proposta contra-homogeneizadora de educação, respeitando individualidades e necessidades de estudantes e docentes, com ênfase aos processos de troca e cuidado nas relações.

“Esse movimento entre terreiro e universidade é o que chamamos no livro de ‘quebrar muros’, conceito que elaboro para explicar como a chegada das mestras pode romper invisibilidades sobre comunidades e saberes. Mãe Dora e Makota Kidoiale reposicionam imaginários sobre lugares que produzem conhecimento e corpos autorizados a ensinar. A chegada à academia é parte de suas trajetórias, e nesse espaço formal oferecem contribuições.”

Para a autora, o livro é resultado de mudanças estruturantes nas universidades brasileiras, como as cotas raciais e o Encontro de Saberes. O projeto nasceu na Universidade de Brasília, em 2010, e foi institucionalizado por meio do Instituto Nacional de Ciência, Tecnologia e Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa- INCTI/CNPq.

Hoje, o Encontro abrange 152 pesquisadores, 45 universidades nacionais, 15 internacionais e 21 entidades da sociedade civil, recebendo mestras e mestres tradicionais das populações negras e indígenas.

“É um movimento que fortalece a democratização do ensino superior, que começou com cotas e se aprofunda com a chegada das mestras e mestres dos saberes tradicionais. Muitas vezes essas/es mestras/es não passaram por espaços formais de ensino e contribuem com a formação do pensamento social brasileiro.”

Nascida no Pará, Beatriz Martins Moura cita também no livro a força da mãe e da avó como fontes de inspiração, ao lado das mestras dos saberes tradicionais.

“Elas me ensinaram e seguem me ensinando sobre o que Conceição Evaristo chamou em sua obra de insubmissão. É uma realidade recorrente entre mulheres negras, que não se submetem a sistemas opressores e reinventam horizontes para si e para os seus”, enfatiza a antropóloga.

Para ela, a obra aponta caminhos de desenvolvimento de um trabalho que centralize os conhecimentos das comunidades de forma não objetificada.

“Estamos falando de pesquisadoras/es que agora pertencem às comunidades que estudam, ou, ainda que não pertençam, estabelecem relações que precisam ser reconstituídas de modo que as mestras e os mestres possam ser apresentadas/os como orientadoras/es dos trabalhos. Essa é a inspiração que entendo que o livro pode deixar para a Antropologia Brasileira”.

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