Em 2019, quando Noah Ribeiro nasceu, o fotógrafo e ativista Thiago Ribeiro foi questionado por médicos se na família existia alguma pessoa com os olhos puxados pois o seu filho tinha nascido com características físicas que se assemelhavam à Síndrome de Down, uma condição genética em que a pessoa nasce com três cromossomos 21 nas células e que provoca interferências no desempenho cognitivo e no organismo dos indivíduos.
Dias depois, ainda na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital, o diagnóstico de Noah foi confirmado e, a partir disso, Thiago passou a buscar por pesquisas e referências para compreender e oferecer o melhor tipo de suporte para o filho, uma criança negra.
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No entanto, o que parecia uma tarefa de simples pesquisa na internet, se tornou um motivo de questionamento para Thiago: como lidar com as especificidades de cuidar de uma criança negra com síndrome de Down?
“Eu comecei a buscar referências de pessoas negras com Síndrome de Down e me deparei com uma matéria falando justamente sobre a invisibilidade. Em mais de 500 comentários as pessoas diziam que nunca tinham visto pessoas negras com síndrome de Down, que achavam que pessoas negras eram ‘imunes’ à síndrome e diziam que não existia pessoas negras com a síndrome”, relata o fotógrafo, que também integra a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.
Foi a partir da falta de informações e das barreiras que encontrou desde o nascimento do filho que Thiago resolveu criar o projeto fotográfico ‘InvisibiliDown‘, inicialmente com a proposta de retratar imagens do próprio filho, uma criança negra com Síndrome de Down, e romper com a invisibilidade causada pela racismo.
“Encontrei um artigo de uma associação americana que dizia que a expectativa de pessoas negras com síndrome de Down chegava à metade da expectativa de pessoas brancas e a conclusão era que a falta de acesso aos serviços de saúde e de acesso às múltiplas terapias que eles precisavam desde o começo de vida para se desenvolver era o que determinava a base da expectativa de vida com relação aos brancos”, explica.
A quase 30 quilômetros de distância de São Paulo, na cidade de Carapicuíba, Alyne Gonçalves conheceu o projeto de Thiago através de uma amiga em comum e se tornou aliada do projeto já que também enfrenta desafios em relação ao acesso aos tratamentos da filha Izadora Gonçalves, uma criança negra de três anos também com Síndrome de Down.
Para ela, é preciso que as mães sejam acolhidas, ouvidas e amparadas com estrutura e elaboração de políticas públicas que garantam o acesso a um tratamento de qualidade para crianças com Síndrome de Down, especialmente as crianças negras.
“Eu acredito muito que para criar políticas públicas ou participar dessa elaboração precisa ser eu, precisa ser a mãe do Vinícius, a mãe da Izabela, porque só eu sei o que é parir uma criança com Síndrome, só eu sei o que é, diariamente, a necessidade dessa criança. Quem melhor para decidir, colaborar e elaborar essas tomadas de decisão do que uma mãe que está ali na luta diariamente?”, questiona Alyne.
Durante as pesquisas que fez sobre pessoas negras com Síndrome de Down, o fotógrafo Thiago Ribeiro mapeou famílias por todo o país que lidavam com os mesmos questionamentos. Com isso, resolveu criar uma iniciativa para fotografar famílias negras com pessoas com Síndrome de Down e atualmente já são mais de 60 cadastradas no Brasil e países como Angola e Espanha.
Recentemente, o projeto foi considerado um dos 100 melhores projetos de fotografia documental da América Latina. O ‘InvisibiliDown’ também conta com campanhas para a realização da segunda etapa do projeto, que consiste em arrecadar recursos para conseguir fotografar as famílias cadastradas.
“Para além da arte que ele [Thiago] move e a conscientização através das fotografias, a gente chegou no consenso que o ‘InvisibiliDown’ precisa ter um impacto social na vida dessas pessoas. A gente se une nesse momento para entender o que a gente pode fazer, de fato, por essas pessoas”, comenta Alyne Gonçalves, uma das integrantes.
Hoje, o projeto se encaminha para se tornar um Instituto voltado para orientação, acolhida assistencial e atividades/materiais de conscientização à causa aliada às questões raciais. A previsão é formalizar o Instituto até o final do ano.
“A gente espera começar o Instituto muito como um farol de colocar luz em um problema que escolheram ignorar e agora não vão ter como ignorar mais”, completa o idealizador Thiago Ribeiro.
Conheça mais sobre o projeto ‘InvisibiliDown’ nas redes sociais e no vídeo abaixo:
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