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‘Tive que provar todo dia que eu era capaz’: como é ser uma mulher negra na comunicação

Em artigo de opinião, a jornalista Roberta Garcia reflete sobre os desafios de ser uma mulher racializada no mercado de trabalho
Imagem mostra a jornalista negra Roberta Garcia.

Foto: Reprodução/Instagram/rogarcia.1

31 de julho de 2024

Por: Roberta Garcia

Embora haja uma crescente conscientização sobre a importância da diversidade e da inclusão, ainda persistem as complexidades e as barreiras históricas e estruturais da sociedade. A ascensão da presença feminina no mercado de trabalho é feita de histórias de conquistas significativas e de constantes desafios. Recentemente, o Brasil alcançou um marco significativo para o gênero e registrou o maior número de mulheres ocupadas desde 2012, com cerca de 43,3 milhões de trabalhadoras, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra por Domicílio (Pnad) de 2023.

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Contudo, é fundamental refletir sobre o mercado de trabalho na sua configuração atual, que ainda é espaço de reprodução das diversas desigualdades, especialmente de gênero e raça, e as mudanças necessárias para criar um ambiente de equidade e de pluralidade. Para além dos desafios que qualquer pessoa que entra no mercado de comunicação sente – a dificuldade de entender em qual campo atuar, como se inserir no setor, entre outros – existe um horizonte mais distante para as mulheres – e se considerar as mulheres negras o caminho é ainda maior. 

De acordo com um estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), entre o 4º trimestre de 2022 e o de 2023, a taxa de desocupação das mulheres diminuiu de 9,8% para 9,2%, o que representa 271 mil trabalhadoras saindo do contingente de desocupados. Todavia, considerando apenas o 4º trimestre de 2023, as mulheres representavam a maioria dos desocupados (54,3%) e 35,5% delas eram negras e 18,9%, não negras. 

Os obstáculos se manifestam em diversas dimensões, como representatividade, discriminação, oportunidades de ascensão, questões salariais, exaustão emocional e autoafirmação diante de um mundo que muitas vezes nos diz que não pertencemos. Como uma mulher negra navegando no mundo da comunicação, sou confrontada diariamente por eles. Em um campo dominado por vozes predominantemente brancas e masculinas, frequentemente as mulheres negras precisam lutar para encontrar espaço e visibilidade. Durante os meus 20 anos como jornalista, repórter e apresentadora, por muito tempo, fui a única mulher negra nas grandes emissoras que trabalhei. E tive que provar todos os dias que eu era capaz e merecia o espaço que estava ocupando.

A verdade é que não saímos todos da mesma linha de partida e nem todos possuem as mesmas oportunidades de estudar inglês e de ter uma vivência profissional no exterior, por exemplo. Existe uma desigualdade na largada, que contribui para os entraves na hora de entrar no mercado de trabalho. Os setores que empregam refletem todo esse racismo estrutural e criam barreiras. E com os meios de comunicação não seria diferente. 

As informações da pesquisa Mulheres no mercado de trabalho, feita pelo Instituto Locomotiva a pedido da consultoria iO Diversidade, apontam as disparidades salariais. As mulheres negras com ensino superior recebem 55% menos que homens brancos com o mesmo grau de escolaridade. Os espaços de poder não foram desenhados para serem ocupados por pessoas negras. Faltam oportunidades, principalmente por conta das diferenças que envolvem o acesso à educação e as condições de vida.

Indiscutivelmente, o racismo atua como um limitante dentro da sociedade, mas se somos questionados com dúvidas a nossa capacidade a todo momento externamente, internamente a estratégia é outra. Ser uma mulher preta não me diminui, e sim me impulsiona. A jovem que fui e que começou como estagiária na TV Cultura, e seguiu como repórter e apresentadora do Grupo Globo, ESPN, SPORTV, UOL e RBS até, atualmente, chegar ao ICL, seguiu a referência de jornalistas como Glória Maria e Zileide Silva.

Somos agentes de mudança e resistência. Nossas vozes são poderosas, nossas histórias são importantes e nosso lugar é inegável. À medida que continuamos a lutar por igualdade e representatividade, devemos permanecer unidas em nossa determinação de criar um futuro melhor, sem as barreiras que nos limitam. Trabalho por um mundo plural e para isso todas as vozes precisam ser ouvidas e valorizadas. Sem inclusão não há justiça e democracia.

Roberta Garcia é jornalista, apresentadora e comunicadora. Em 2023, foi eleita a quarta jornalista negra mais admirada da imprensa brasileira.

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