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Pandemia agrava mortalidade por doenças que afetam mais a população negra

Desde o início do período pandêmico, houve um aumento de 25% dos óbitos a partir de doenças "raciais", como diabetes e hipertensão 

A foto mostra o Plenário da Câmara dos Deputados

Foto: Câmara dos Deputados

8 de junho de 2022

Que a pandemia de Covid-19 afetou a população negra e periférica de forma mais profunda é uma realidade. Por conta disso, no período também foi observado um agravamento das mortes de pessoas negras por doenças consideradas “raciais” – comorbidades que atingem mais um grupo racial do que outros.

Diabetes, hipertensão, doença falciforme entre outros diagnósticos são mais prevalentes em pessoas negras. Segundo informações do levantamento “Disparidades raciais no excesso de mortalidade em tempos de Covid-19”, no estado de São Paulo, em que 40% da população é negra (preta e parda), houve o maior número de óbitos no período pandêmico e a maior desigualdade entre as populações branca e negra.

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“A mortalidade aumentou para ambas as raças/cores, mas, entre negros, a situação foi pior: os aumentos chegaram a 25,1% – enquanto para brancos, foi de 11,5% para tais comorbidades”, diz o informe.

Segundo o Prof. Kabenguele Munanga, embora a ideia de “raças” humanas tenha sido extinta pela ciência na segunda metade do século XX – quando os estudos genéticos demonstraram a homogeneidade populacional –, ela deixou um “filhote”: o racismo. É o que aponta o membro da coordenação do GT Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Hilton P. Silva, docente do Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Sociedade na Amazônia.

“As doenças que acometem com maior frequência a população brasileira atualmente são as chamadas doenças crônico-degenerativas, como a hipertensão e a obesidade, que somadas à doença falciforme têm um impacto elevado na morbi-mortalidade desse grupo. Mas a maioria das causas de mortalidade na população negra brasileira tem a ver com as condições sanitárias e ambientais nas quais sobrevive a população brasileira e com o racismo que impera no país”, avalia o pesquisador.

Pandemia agravou o que já existia

Para Altair dos Santos Lira, Mestre em Saúde Coletiva, Especialista no Campo da Saúde da População Negra e das Iniquidades em Saúde, com ênfase nos estudos sobre a Doença Falciforme e seus impactos sócio-políticos, a pandemia apenas acentuou os problemas que já existiam a respeito das doenças prevalentes na população negra, em especial, na dificuldade de acesso aos serviços de saúde.

“Durante a pandemia, pessoas que tinham consultas com hematologistas, consultas com cardiologista, deixaram de fazer essas consultas ou tiveram procedimentos suspensos por conta da Covid-19. Isso veio exatamente agravar o seu estado de saúde. Então, a pandemia vem exatamente expor esta gravidade dessas doenças junto a população negra”, avalia.

Hilton Silva destaca que a população negra apresenta maiores taxas de mortalidade por doenças evitáveis e preveníveis, como pré-eclâmpsia, câncer de mama, infarto, AVC, tuberculose e AIDS, entre outras há muito tempo. Contudo – e como resultado do racismo estrutural e institucional – todos os negros e negras têm mais dificuldades em acessar serviços de saúde em geral para dar prosseguimento ao tratamento, segundo ele.

“O racismo faz com que eles [negros] vivam em áreas mais degradadas, em piores condições de moradia e com menos acesso a saneamento. A pandemia de Covid-19, portanto, apenas agravou uma situação pré-existente, e afetou desproporcionalmente a população negra, ampliando a mortalidade por outras doenças, que deixaram de ser priorizadas em decorrência do SARS-CoV-2”, ressalta.

Medidas anti-mortalidade esbarram no racismo

O especialista Altair Lira ainda pondera que ao analisar a proposta nacional de saúde integral da população negra, é possível notar políticas que falam sobre reconhecer as desigualdades étnico-raciais como motivadores da mortalidade.

“Estamos falando de analisar a questão da saúde da população negra dentro de um sistema de saúde que deveria atender a todos e todas, mas que dentro do seu âmago, está esse germe do racismo institucional. É necessário considerar efetivamente essas doenças e agravos como potenciais causadores da morte e do sofrimento da população negra. Precisamos de políticas públicas que atendam às pessoas”, enfatiza.

Já o membro da coordenação da Abrasco, Hilton Silva, considera que o elemento fundamental para reduzir a morbi-mortalidade na população negra, inclusive por causas externas, é a tomada de consciência por todos a respeito do racismo.

“Vivemos em uma sociedade historicamente racista, que discrimina as pessoas por sua aparência, sua religiosidade, seu modo de falar e de ser e que isso tem repercussões na sua qualidade de vida. O reconhecimento do racismo estrutural, a implementação de políticas públicas antirracistas e a mobilização social contra todas as formas de discriminação são medidas fundamentais para a garantia de saúde para a população”, pondera.

Hilton pontua ainda que atualmente há diversas políticas públicas voltadas para a saúde da população negra (SPN), como o Estatuto da Igualdade Racial, a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, a Estratégia de Saúde da Família Quilombola, a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais, e até a Lei 10639/13, pois o reconhecimento da diversidade é fundamental para saúde.

“Todas elas buscam implementar a equidade na sociedade e garantir que as pessoas sejam tratadas de acordo com as suas especificidades, como previsto na Constituição Federal e na legislação do SUS. O problema é que essas legislações encontram barreiras para sua implementação, em grande parte pela ideia/mito de muitos gestores que o Brasil é um ‘paraíso racial’, onde todos são tratados iguais”, finaliza.

Leia também: ‘Mais de 160 milhões de pessoas são empurradas para a pobreza durante a pandemia’

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