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Defensores públicos repudiam cobrança de R$ 10 milhões da Magalu por trainee para negros

6 de outubro de 2020

Defensoria Pública da União (DPU) considera que o programa para inclusão de profissionais negros em cargos de liderança é “lacração”; Ministério Público do Trabalho já declarou que o programa é constitucional

Texto: Guilherme Soares Dias | Edição: Nataly Simões | Imagem: Pexels/August de Richelieu

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A Associação Nacional de Defensoras e Defensores Públicos (Anadep) e profissionais que integram o Grupo de Trabalho e Políticas Etnorraciais da Defensoria Pública da União (DPU) divulgaram nesta terça-feira (6) nota técnica de repúdio à ação civil pública aberta pelo órgão para cobrar R$ 10 milhões da Magazine Luiza por causa do programa de trainee exclusivo para negros anunciado pela empresa em setembro.

Para a defensoria, o valor deveria ser pago como multa por danos morais coletivos por “discriminar milhões de trabalhadores brancos e de outras etnias, inviabilizando o acesso ao mercado de trabalho”. Segundo o defensor público Jovino Bento Júnior, o motivo do trainee exclusivo para negros é fazer o que ele chama de “marketing de lacração”. O órgão cuja missão é defender e orientar juridicamente os necessitados diz que a inclusão social de negros é “desejável”, mas não pode ocorrer “às custas dos direitos sociais de outros trabalhadores”.

Onze defensores do Grupo de Trabalho Políticas Etnorraciais ressaltam que é função da Defensoria Pública “exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado” e reforçam que” entre os grupos que merecem proteção especial do Estado está a população negra”. Os defensores lembram que o próprio Estado concede às pessoas negras o direito de concorrer a vagas de emprego público destinada para esses grupos.

Os defensores citam ainda o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso, que diz “a cota racial é mecanismo emergencial e paliativo de promover ascensão social e, sobretudo, de propiciar à próxima geração – os filhos dos cotistas – maiores chances de romper o cerco e de ter acesso a bens sociais e valores culturais que fazem a vida ser melhor e maior” e conclui que a medida “não reflete a missão e posição institucional da Defensoria Pública da União quanto a defesa dos direitos dos necessitados. Mais que isso, contraria os direitos do grupo vulnerável cuja DPU tem o dever irrenunciável de defender”.

A Anadep destacou que as ações afirmativas têm previsão no programa de ação de Durban, na convenção para eliminação da discriminação racial e no estatuto da igualdade racial. O documento afirma que as ações inclusivas devem permear ações tanto do poder público, quanto de empresas e que “nenhuma ação isolada vai apagar a luta de proteção de direitos de grupos em situações de hipervulnerabilidade” feitas ao longo da história pela Defensoria Pública.

O professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Thiago Amparo, classificou a medida como grave em postagem no Twitter e afirmou que não tem “qualquer fundamento legal”. Segundo o professor, o órgão não leu a Constituição Federal. Ele cita o artigo 1.4 do decreto 65.810/69, onde é dito que “não é considerado discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção”.

Amparo recordou também o artigo 39 da Lei 12.888/2010. “O poder público promoverá ações que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra, inclusive mediante (…) o incentivo à adoção de medidas similares nas empresas e organizações privadas.”.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) já havia rejeitado uma denúncia feita contra o programa anunciado pela Magazine Luiza em setembro. De acordo com o órgão, a iniciativa é constitucional e visa combater o racismo e a desigualdade no mercado de trabalho.

Em São Paulo, por exemplo, de todos os profissionais contratados entre janeiro e junho de 2020 para cargos de liderança, somente 15,5% eram negros. Os dados são do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados).

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