No próximo ano, completa-se 30 anos da primeira gravação oficial do rapper MV Bill, voz transgressora que desafia a indústria cultural brasileira ao mostrar o Rio de Janeiro que existe fora dos cartões postais.
Como forma de contar um pouco do que viu em quase três décadas, ele lança o livro “A Vida Me Ensinou a Caminhar”, escrito em 2020 e publicado pela editora Age, este mês.
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Em 224 páginas, distribuídas em 27 capítulos, Alex Pereira Barboza, o MV Bill, narra suas experiências e visões de mundo a partir das histórias que viveu como rapper, cineasta, escritor e também ativista.
Desde 1993, quando participou da coletânea “Tiro Inicial”, MV Bill lançou 12 álbuns, o mais recente saiu este ano e se chama “Voando Baixo”.
Como escritor, MV Bill tem experiência em contar a dura realidade da população oprimida do Rio de Janeiro e a violência urbana, consequência da ação do Estado na chamada “Guerra às Drogas”. Em 2005, junto com Celso Athayde e Luiz Eduardo Soares, publicou o livro “Cabeça de Porco”.
No ano seguinte, em 2006, “Falcão – Meninos do Tráfico” saiu em livro e DVD, projeto que se tornou nacionalmente conhecido após exibição no programa Fantástico, da Rede Globo. O documentário conta a história de dezessete jovens que se envolveram com o tráfico de drogas, em que somente um deles sobreviveu.
Em “A Vida Me Ensinou a Caminhar”, que MV Bill insiste em dizer que não é uma biografia, o rapper conta histórias da carreira, de como alguns das suas músicas foram compostas; relata momentos de tensão; fala de diversas viagens que fez pelo país e comenta também alguns momentos marcantes da história do rap brasileiro.
A turnê de lançamento do livro terá sessões de autógrafos no Rio de Janeiro, no dia 27 de abril; em São Paulo, no dia 3 de maio e em Porto Alegre, dia 5 de maio.
Entre as histórias do livro, Bill lembra que em 2001, quando já era um músico conhecido nacionalmente, dois policiais abordaram ele e ficaram rodando por horas dentro da Cidade de Deus. “Eles não conseguiam conceber a possibilidade de eu estar com dinheiro na carteira, ter uma passagem de avião no bolso, sem ser um traficante”, disse o rapper.
Violência
À Alma Preta Jornalismo, o cantor comenta ainda que o modelo de segurança pública do Rio de Janeiro é parte da engrenagem que promove o genocídio dos jovens negros no país, aumentando ainda mais os índice de violência.
“Morrem muitas pessoas negras por conta das supostas balas perdidas. Muitas vezes, não há nenhuma comoção, nenhuma preocupação e nem um pedido de desculpas para a família que perdeu alguém vítima da bala do Estado”, compartilha o rapper.
Entre o modelo das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), criadas em 2008, e o modelo “Cidade Integrada”, anunciado pelo governo estadual, em janeiro de 2022, para substituir as UPPs, Bill não vê avanços na garantia de direitos da população negra e pobre.
“A visão do combate às drogas é muito errada e não é um modelo de segurança pública cidadã. É, na verdade, um combate contra uma população, porque existe uma visão errônea de que as pessoas dentro da comunidade são todas bandidas e pode chegar atirando. Contra pessoas pretas, eles acham que podem fazer qualquer coisa”, acredita o rapper.
O racismo no Rio de Janeiro e também em outras praças do país, de acordo do MV Bill, é um dos elementos que fundamenta a brutalidade policial, porque tira toda a empatia dos agentes do Estado e reforça a criminalização e a desumanização de pessoas negras.
“A política de racismo é muito enraizada. Tenho amigos que são policiais militares que quando estão sem o uniforme são, assim como eu, um alvo potencial da brutalidade da própria polícia. Eu digo para eles, que quando eles estão de farda é como se fosse uma fantasia que diz que eles são diferentes, mas eles não são. Já me contaram que também são enquadrados de forma bruta. Ao sair de casa, a pessoa preta se torna um alvo de todo o tipo de coisas no Rio de Janeiro”, comenta o rapper.
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