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Relatório mostra desmonte na política de igualdade racial no Brasil

15 de setembro de 2020

Documento aponta, por exemplo, a extinção do Programa de Enfrentamento ao Racismo e Promoção da Igualdade Racial após uma queda de 80% nos recursos entre 2014 e 2019

Texto: Flávia Ribeiro | Edição: Nataly Simões | Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

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Não há menções aos públicos negro e quilombola e ao racismo no Plano Plurianual 2020-2023, que é o documento de planejamento das prioridades de ações do governo federal pelo período de quatro anos. Esse é um dos dados apresentados pela assessora política Carmela Zigoni, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), em audiência pública realizada na última semana, na Câmara Federal, em Brasília. O evento debateu a situação da população negra e quilombola durante a pandemia da Covid-19, o novo coronavírus.

“Isso é um total apagamento, no plano que organiza as políticas públicas para quatro anos, de todas as conquistas da sociedade em relação ao enfrentamento ao racismo e promoção da igualdade racial alcançadas desde a Constituição de 1988. É como se o legado – dos movimentos sociais, das conferências locais e nacionais, da tentativa de estruturação de uma política pública – estivesse sendo apagado”, alerta a assessora.

A apresentação demonstrou o desmonte da política de igualdade racial no Brasil. Os dados mostram o corte de 80% dos recursos do programa 2034- Enfrentamento ao Racismo e Promoção da Igualdade Racial, entre os anos de 2014 e 2019. Os números mostram ainda a extinção do programa no PPA 2020-2034, aprovado em dezembro de 2019 pelo Congresso Nacional, ou seja, antes mesmo da crise causada pela pandemia. Esse era o programa orçamentário que financiava parte da política de regularização fundiária e sustentabilidade local de territórios quilombolas, além de financiar a Secretaria de Promoção de Políticas de Igualdade Racial, que tinha status de Ministério até 2015, passando a ser uma secretaria dentro do Ministério de Direitos Humanos.

“A extinção de um programa orçamentário que determina recursos para o enfrentamento ao racismo faz com que esta pauta só receba recursos se o gestor público considerar relevante. Além disso, a inexistência de um programa orçamentário específico invisibiliza a população negra no orçamento, dificultando também o controle social pela sociedade”, explica Carmela.

O relatório informa ainda uma redução de 75%, entre 2014 e 2019, e a utilização de apenas 13% (R$ 77 milhões) dos R$ 575 milhões disponíveis atualmente Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), que é responsável por grupos em vulnerabilidade, como mulheres, idosos, indígenas, crianças e adolescentes. A Secretaria Nacional de Promoção da Igualdade Racial, embora existente dentro da estrutura do MMFDH, até julho não possuía rubrica especifica, mas neste mês conta com R$ 2,6 milhões dos R$ 575 milhões disponíveis no ministério.

Com base no Portal Siga Brasil, do Senado Federal, com acesso em agosto, a assessora apresentou que desde 2017 não há recurso disponível para regularização fundiária (Ação 210Y). Em 2020, havia R$ 3,2 milhões disponíveis, mas nada havia sido pago até 25 de agosto. Situação similar a ação apoio ao desenvolvimento sustentável (Ação 210Z), sem recursos desde 2018.

Por outro lado, órgãos não estão usando os recursos disponíveis. Um exemplo é a Fundação Cultural Palmares (FCP), que recebeu autorização de R$ 21,3 milhões, mas que sequer há rubrica específica para a população quilombola. Outro exemplo é que no Ministério da Cidadania haviam sido pagos somente R$ 364 mil reais dos R$ 7,3 milhões autorizados na Ação 2792 – Alimentos, Povos e Comunidades Tradicionais.

“A Fundação Cultural Palmares tem como missão o fomento e preservação das manifestações culturais negras; o apoio e difusão da Lei nº 10.639/03, que torna obrigatório o ensino da História da África e Afro-Brasileira nas escolas; e emissão das certidões de reconhecimento de comunidades quilombolas. Quando a FCP não aloca rubricas específicas para os quilombolas, não conseguimos saber se de fato os recursos estão sendo alocados para este público, que é diretamente impactado pelas 3 principais ações da Fundação”, analisa Carmela.

Dos R$ 500 bilhões autorizados pelo Congresso Nacional para enfrentamento da Covid-19, somente 61% foram executados até 25 de agosto. Em junho, o Inesc havia denunciado que o percentual era de apenas 30%. Outros fatores do orçamento público que afetaram diretamente a vida de pessoas negras e quilombolas é a perda de R$ 20 bilhões em áreas como a saúde para atender o teto de gastos e também o corte de 20% do orçamento em saneamento, mobilidade urbana e moradia.

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