As violações de direitos humanos afetam a população negra no Brasil em diferentes níveis, como a violência policial e perda de direitos das comunidades tradicionais. É o que avalia Jurema Werneck, diretora-executiva da Anistia Internacional, que concedeu entrevista exclusiva ao Alma Preta. “Se as reivindicações do movimento negro fossem acolhidas pelo governo, o Brasil inteiro iria ganhar”, diz.
A Anistia Internacional divulgou no dia 27 de fevereiro um relatório anual que reúne análises da situação dos direitos humanos no Brasil e na região das Américas. A organização internacional afirma que o ano de 2019 foi marcado por retrocessos no país baseados nos discursos e políticas de Jair Bolsonaro e outras autoridades como o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).
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Confira a entrevista completa:
O que o relatório traz de novidade? É o que estas “novidades” têm a ver com o governo Bolsonaro?
O relatório na realidade não traz novidades, mas o que aconteceu no Brasil e nas Américas em termos de direitos humanos no ano de 2019. Apontamos como um ponto importante as ideias que o presidente Jair Bolsonaro desenvolveu no período eleitoral de 2018 e que foram transformadas em políticas públicas muito ruins e nefastas para todas as pessoas.
De acordo com o relatório, os governantes brasileiros propagam discursos contrários aos direitos humanos por meio de medidas administrativas e legislativas. De que forma, essas medidas afetam a população negra?
Durante o período eleitoral de 2018 nós vimos discursos racistas e que violam os direitos humanos das comunidades indígenas e quilombolas. No campo da segurança pública, os discursos se transformam em políticas que tiveram como resultado o aumento das mortes violentas em 2019.
A gente chama atenção para o estado do Rio de Janeiro, onde políticas nefastas aumentaram o número de mortes. Inclusive, no ano passado, pelo menos cinco crianças negras morreram vítimas da violência policial. Esse é um exemplo de como a população negra é afetada por políticas que violam os direitos humanos.
Após a publicação do relatório, o governador Wilson Witzel publicou uma nota onde continua a defender sua política de segurança pública. Diante disso, qual a recomendação da Anistia Internacional para diminuir a violência que afeta as populações mais vulneráveis, sobretudo, as que vivem nas periferias?
É preciso destacar que o fato de o governador do Rio de Janeiro ter se posicionado é um passo importante. Lamentamos por ele se recusar a admitir que a prática dele não tem nada a ver com os direitos humanos. Com isso, Witzel corre o risco de se enquadrar em crimes de direitos humanos.
Nossas propostas, que não foram acatadas pelo governo do estado, estão ligadas a ações de segurança pública. Tanto a Anistia Internacional quanto o movimento negro brasileiro denunciaram a nível internacional as políticas que violam os direitos humanos. A Anistia foi a embaixadas de diversos países para pressionar o governo federal sobre as violações. Agora, a pressão e mobilização devem continuar. Se as reivindicações do movimento negro fossem acolhidas pelos governantes, o Brasil inteiro iria ganhar.
Segundo o documento, o governo de Jair Bolsonaro não cumpriu em 2019 com a obrigação de proteger os povos indígenas. Em relação às políticas do governo brasileiro que podem prejudicar as comunidades quilombolas, qual o posicionamento da Anistia Internacional?
Nosso posicionamento em relação às comunidades quilombolas é o mesmo das comunidades indígenas. A Anistia tem denunciado políticas que violam os direitos dos quilombolas. Nossa missão é apontar as necessidades de preservação da vida e o viés racista dos ataques que essas populações são submetidas. Tudo isso é pressionar as autoridades a cumprirem com suas obrigações de defender esses povos.
Como está a situação dos direitos humanos no Brasil se comparada a dos outros países? Pode-se dizer que a situação do Brasil é pior ou melhor que a de outras nações?
Toda violação de direitos humanos possui a mesma gravidade, independente se é contra um grupo pequeno ou grande de pessoas. No caso do Brasil, nós precisamos avançar nas políticas de direitos humanos, pois os governantes agem contrários aos direitos humanos.