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Durante a ditadura militar, havia temor de conflitos raciais no Brasil

Documento criado em 1969, durante o regime militar, sinaliza para o receio de crescimento das tensões raciais no país

Imagem: Reprodução / Agência Brasil

Foto: Imagem: Reprodução / Agência Brasil

31 de março de 2022

O livro “Brasil ano 2000 – O futuro sem fantasia”, publicado em 1969, durante a ditadura militar, é uma coletânea de artigos sobre as previsões do país em diversas áreas, como religião, sociologia, saúde, entre outros. Na seção de sociologia, há um sub-capítulo com o nome de “Crise racial no Brasil – Ano 2000”, com previsões de possíveis conflitos.

O artigo se inicia com uma afirmação do sociólogo Nelson Mello e Souza, “O negro e o mulato poderão recorrer à violência, nos próximos 30 anos, para se integrarem na sociedade industrial de massas que vai marcar o Brasil”.

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O texto indica que as pessoas negras da época da ditadura estavam em condições de vida de exclusão, o que dificultava o acesso à universidade e a bons empregos. “Mesmo quando reúne essas condições, dispositivos de contenção são deflagrados, procurando impedir sua escala social”, completa, em referência à não contratação de profissionais, mesmo capacitados, por discriminação racial.

Para o artigo, duas situações foram possibilitadas ao negro da época, a primeira, a de seguir em trabalhos subalternos, e a segunda, ficar no desemprego e se utilizar da “malandragem” como um meio de vida. “Tornar-se um criminoso, um alcoólatra ou – para as escravas “libertadas” – prostitutas”.

A chegada do século de XXI traria uma situação conflitante para a sociedade, a de lidar com a inserção do negro na sociedade industrial e de classes, como previa Florestan Fernandes, e a manutenção da discriminação de brancos contra negros.

“Como reagiram os brancos à ascesão social do negro?”, pergunta o autor do texto. Ele se utiliza do exemplo dos EUA para sinalizar que a elite branca respondeu de modo violento e assim cria uma expectativa de tensão para o Brasil. 

“Os dados sociológicos levam o sociólogo Mello e Souza a responder sim à pergunta sobre a possibilidade de luta racial futura entre nós. O Brasil 2000 terá, em sua história, episódios de luta racial. Os anos 80 e, principalmente, os anos 90, encontratão os negros em posição de reivindicar trânsito livre por áreas até então fechadas. Esse fechamento de áreas ao negro, hoje em dia, não provoca conflitos, porque é precária a situação sócio-econômica do negro não lhe permite exigir, reivindicar com decisão”.

Apesar das previsões, o autor não acreditava que o Brasil poderia ter um formato de conflito semelhante ao existente nos EUA e na África do Sul. 

A importância para a questão racial na coletânea aparece no texto de abertura, com um questionamento sobre o comportamento da branquitude com a possível ascensão social de pessoas negras. O texto é assinado por José Itamar de Freitas.

“Hoje, os negros não incomodam, mas o que acontecerá quando eles tiverem – ainda que uma minoria expressiva deles – poder econômico para comprar títulos de clubes fechados, ou forçar sua entrada nos colégios mais caros, ou forçar sua admisão nos escritórios ou postos importantes, ou morar nas zonas residenciais de “primeira classe”? Estaremos maduros, bastante, para aceitá-los como irmãos em tudo, ou vamos partir para conflitos raciais?”.

O livro também aborda, como no artigo “O país dos mulatos claros”, uma perspectiva de fortalecimento de um ideário de miscigenação no Brasil, com a maior existência de relacionamentos interraciais. Para o autor desse artigo, o país não seria mais uma nação de “brancos e pretos”, mas, sim, de mestiços.

Publicado pela Biblioteca do Exército em co-produção com a Editora Monterrey, a obra foi organizada por José Itamar de Freitas. A parte destinada à sociologia foi fundamentada em referências dos sociológicos Florestan Fernandes e Nelson Mello e Souza. 

Os artigos do livro não estão assinados. Há apenas a sinalização da equipe de pesquisa e orientação para desenvolvimento do material.

Leia mais: ‘Resistência à ditadura militar não foi apenas branca, masculina e de classe média’, lembra socióloga

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