“Eu não faria a militância que eu faço se não fosse o hip-hop e o rap”, compartilha o pré-candidato ao governo de Pernambuco Jones Manoel (PCB). A declaração foi feita em entrevista no Youtube para o rapper brasiliense Genival Oliveira Gonçalves, mais conhecido pelo seu nome artístico GOG na noite desta terça-feira (16).
O historiador, de 32 anos, afirmou que as letras do rap foram responsáveis por dar a ele consciência política e de classe. “[O rap] é uma grande formador político”, afirmou. Formado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e mestre em Serviço Social, o professor, escritor e influenciador digital nasceu na favela da Borborema, em recife, e desde pequeno sofreu as consequências de ser um homem negro e pobre.
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
“O rap foi o primeiro a me dizer que as coisas não estavam certas, que o mundo estava errado”, disse o político. Segundo ele, as letras de GOG, dos Racionais MCs e também do estadunidense Tupac Shakur, assassinado em 1996, mostrava exatamente a realidade em que se vivia: Manoel teve o pai assassinado pela milícia aos 11 anos e começou a trabalhar aos 13 para ajudar a mãe, que era doméstica, a criar os irmãos.
Na canção ‘Jesus Chorou’, do grupo paulista Racionais MCs há uma estrofe que cita lideranças que lutavam contra o racismo, as opressões e as diferenças sociais. A letra da música reverencia os mártires, que foram assassinados em decorrência da discordância política, econômicas e sociais que seus ideais representavam.
“Gente que acredito, gosto e admiro/ brigava por justiça e paz, levou tiro/ Malcolm X, Ghandi, Lennon, Marvin Gaye/ Che Guevara, 2pac, Bob Marley, o evangélico Martin Luther King”, diz a canção.
O fato de ser um adolescente que precisou trabalhar e estudar ao mesmo tempo mostrou para Jones Manoel que as teorias meritocráticas não se aplicam à maior parte da população brasileira. Então, ele conta que se perguntava o motivo de não ter o direito de se dedicar apenas aos estudos, de ter que morar em um bairro com baixa infraestrutura, de ter que sair sempre bem vestido e portando os documentos caso ocorresse uma abordagem policial.
“A minha história de vida fez com que eu tivesse posicionamentos considerados radicais. Isso se reflete na política, no fato de eu ser comunista, de não acreditar em um acordo entre patrão e empregado, de não acreditar que a vida do povo pode mudar sem mudar o sistema”, explicou.
De acordo com Manoel, a construção da negritude de muitos jovens periféricos, influenciada pela cultura hip-hop, continua sendo marginalizada por parte da sociedade. “Tupac foi o primeiro ideal de beleza negra para mim”, confessou. No entanto, por ser um homem negro, pré-candidato ao governo de Pernambuco, professor e escritor ele diz que as pessoas constumam reduzir seus conhecimentos às questões de raça e cor. Dessa forma, ele salienta que “pessoas negras são extremamente competentes para falar e atuar em diversas frentes” e lembra que tem estudos de economia, história, segurança pública e das mais variadas áreas necessárias a um gestor público.
GOG, que é considerado um dos pioneiros do hip hop brasiliense e lançou seu primeiro trabalho em 1992, afirmou que, atualmente, o rap tem entrado em um nicho pouco representativo das classes populares. Por isso, o teor político das músicas e das influências para a juventude não trazem um efeito crítico.
“Hoje, a ostentação chama muita atenção da juventude. Eles acreditam que para ‘ser alguém’ é necessário um carrão”, afirmou o artista. Porém, ele reconhece que essa estrutura é “muito superior aos jovens” e que “é muita tentação sendo exposta”, em referência a cultura do consumo mais evidenciada pelo neoliberalismo.
Conheça Jones Manoel
Jones é popular nas mídias socias, com mais de 189 mil inscritos no Youtube, 158 mil pessoas no Twitter e 151 mil seguidores no Instagram. Ele compartilha conteúdos sobre política, questões raciais, economia e análises de conjunturas a partir da ótica marxista. Apesar de expoente na Internet e na academia, o escritor militante do PCB não tem ainda uma carreira na política e deve enfrentar no governo de Pernambuco os veteranos Miguel Coelho (DEM), Raquel Lyra (PSDB) e Marília Arraes (PT).
O professor de história, comunista e mestre em Serviço Social ficou ainda mais conhecido após ser citado por Caetano Veloso em uma entrevista ao jornalista Pedro Bial. Na ocasião, o cantor disse que por meio do livro escrito por Manoel ‘Revolução Africana: Uma Antologia do Pensamento Marxista’, deixou para trás alguns pensamentos de “liberalóides”, e também mudou preconceitos sobre governos socialistas.
Segundo o político estreante, o seu propósito é apresentar um “programa socialista para Pernambuco”, como “alternativa radical” para “a dicotomia entre a direita tradicional e a falsa esquerda”. O seu partido, porém, não tem nenhum cargo eletivo no Brasil. De acorco com a revista Carta Capital, a última vez que alguém da legenda exerceu algum posto foi em 2015, quando Marta Jane, de Goiânia (GO), assumiu a vaga do vereador Elias Vaz (PSOL) por algumas semanas.
Leia mais: Bandas Black Pantera e Devotos promovem noite antirracista no Rock in Rio