Vereadora negra terminaria seu primeiro mandato no fim de 2020 e teve mais que o dobro de votos do que 34 dos 51 vereadores eleitos no Rio de Janeiro em 2016; durante sua passagem pela Câmara dos Vereadores, ela levou a favela e a negritude para o centro da política carioca
Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões I Imagem: Reprodução
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Marielle Franco completaria 41 anos de vida neste 27 de julho e terminaria seu primeiro mandato como vereadora do Rio de Janeiro neste ano. Sua eleição, em 2016, com mais de 46 mil votos numa disputa eleitoral dominada por homens brancos e conservadores representou uma vitória consistente da voz negra e periférica.
A distribuição dos votos recebidos por Marielle, que se candidatou pelo PSOL, mostra que ela conseguiu uma quantidade expressiva de votos nas regiões mais pobres do Rio, cerca de 33% dos votos, como na Zona Norte da cidade. Além de eleitores em regiões de classe média e nível alto de escolaridade, cerca de 32% votos na Zona Sul.
“No parlamento, Marielle empenhou-se na defesa LGBTQI+ e de outras mulheres negras como ela, propôs políticas públicas inclusivas, escancarou a necessidade de se falar sobre pobreza, sobre a injusta desigualdade que nos assola, reverberou o incessante extermínio de jovens pretos”, lembra a deputada estadual Dani Monteiro (PSOL), em entrevista ao Alma Preta.
Marielle Franco foi assassinada no 15º mês de um mandato de 48 meses, que terminaria no final de 2020. No período em que esteve no cargo de vereadora, ela apresentou 16 projetos de lei. Na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, uma de suas propostas foi o programa “Pra fazer valer o aborto legal”. A vereadora sugeriu as “Casas de Parto” para a rede municipal de saúde e criou a campanha #AssédioNãoÉPassageiro.
“Depois de sua morte, teve a onda conservadora do bolsonarismo, mas ela também inspirou a eleição de muitas representações negras. A Mari foi uma grande liderança. A galera preta tinha muito orgulho e se identificava com ela. Na Câmara, ela, uma cria da Maré, estava peitando a milícia, peitando a polícia corrupta e a gente via ela como uma futura prefeita ou governadora”, conta o jornalista Bruno Sousa, morador da favela do Jacarezinho.
Marielle cresceu no Complexo da Maré, na Zona Norte, região formada por 16 favelas e com mais de 130 mil moradores. Os votos recebidos por ela nas eleições municipais de 2016 foram mais que o dobro dos recebidos, individualmente, por 34 dos 51 vereadores eleitos. Era a primeira eleição daquela mulher negra e defensora dos direitos humanos e em um cenário com 55,6% de candidatos brancos e 68,2% de homens.
“Ela foi a síntese de um sonho da população LGBTQI+, negra e de religião de matriz africa. Ela trouxe a negritude para o centro da política. Quando a Carolina Maria de Jesus fala que o Brasil precisa ser governado por quem já passou fome, a gente pode ampliar um perfil de quem viveu o que é uma política de segurança falha, passou por uma política de proteção aos mais vulneráveis falha e sobreviveu. Mari chegou lá e a morte dela mostra o quão violento são esses espaços para os corpos negros”, diz o cientista político Seimour Souza, que atuou na campanha da ex-vereadora. Atualmente, o assessor faz parte da equipe da deputada estadual Renata Souza (PSOL), ex-chefe de gabinete da Marielle e pré-candidata à prefeitura do Rio.
Já se passaram 866 dias desde que a vereadora foi assassinada, na noite de 14 de março de 2018, junto com o motorista Anderson Gomes, no Centro do Rio de Janeiro. Até agora, os possíveis mandantes do crime não foram identificados.
“Marielle resiste no coração machucado de sua família, na aflição dos amigos, na luta que seus companheiros decidiram não interromper. Conhecê-la e desfrutar da sua companhia e da sua humanidade é um privilégio que eu carrego para a vida”, diz Dani Monteiro. “Ela teria produzido mais se não tivesse sido tão barbaramente interrompida. Marielle tornou-se símbolo de uma atuação progressista e pela justiça para todos”, completa a deputada estadual.