As organizações apontam que a intensa desigualdade social e abandono estatal implicam em maior vulnerabilidade das comunidades ao novo coronavírus
Texto: Redação | Edição: Nataly Simões | Imagem: Felipe Araújo/Fotos Públicas
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A Coordenação Nacional de Comunidades de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), a Coalizão Negra Por Direitos e a Terra de Direitos denunciaram a situação de extrema vulnerabilidade das comunidades quilombolas brasileiras, agravadas pela pandemia da Covid-19, ao Grupo de Trabalho da ONU sobre Pessoas de Descendência Africana da Organização das Nações Unidas (ONU) durante a 45ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos, no dia 30 de setembro.
Em vídeo exibido ao Conselho e aos Estados-membros, a advogada Vercilene Dias destaca a omissão do governo brasileiro em garantir os direitos constitucionais das comunidades quilombolas. Vercilene orientou como racismo institucional expresso no esvaziamento do orçamento para áreas sociais e o desmonte da política quilombola, sob comando de ruralistas e oposicionistas à titulação dos territórios tradicionais, acentuaram as vulnerabilidades dos quilombos, especialmente diante da crise sanitária e econômica provocada pelo novo coronavírus.
A denúncia faz referência à ação protocolada pela Conaq e partidos em 9 de setembro, que obriga o governo federal a adotar medidas de urgência no combate à pandemia nos quilombos e de proteção a essas comunidades. Sob relatoria do ministro Marco Aurélio Mello, a ação foi enviada ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) na última semana para julgamento da corte. O ministro também pediu pareceres da Procuradoria Geral da República (PGR) e da Advocacia Geral da União (AGU) em até cinco dias. O Grupo de Trabalho da ONU apresentou um informe no qual destaca, de maneira crítica, a manifestação do racismo sistêmico no Brasil.
Mesmo com a intensa subnotificação do critério raça/cor/etnia em mais de 25% do total de óbitos, a população negra corresponde a 41% do total de óbitos, de acordo com o boletim epidemiológico nº 28 do Ministério da Saúde, de 26 de agosto.
Segundo as organizações que fizeram a denúncia, neste quadro de invisibilidade da manifestação da doença na população negra, as realidades presentes nas comunidades quilombolas é ainda menos reconhecida pelo governo federal, já que o Estado não tem mapeado e divulgado os casos de infecção e óbitos nas comunidades.
Diante da lacuna informativa, a Conaq tem mapeado voluntariamente a manifestação dos casos e constata que os povos quilombolas estão mais suscetíveis a morrer de Covid-19 que o resto do país. A taxa de letalidade desse grupo é de 3,6%, enquanto a da população em geral é de 3,1%, dado subnotificado por não haver monitoramento dos casos e mortes entre quilombolas pelo Estado brasileiro.
Além da ausência de ações dirigidas à população quilombola no contexto da Covid-19, as organizações também apontam que a intensa desigualdade social e abandono estatal implicam em maior vulnerabilidade à doença. Cerca de 75% da população quilombola vive em situação de extrema pobreza, dispondo de precário acesso às redes de serviços públicos, conforme revela uma pesquisa do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Apenas 15% dos domicílios têm acesso à rede pública de água e 5% à coleta regular de lixo, e em 89% dos domicílios o lixo doméstico é queimado. Só 0,2% estão conectados à rede de esgoto e de águas pluviais. O acesso à água e estruturas adequadas de saneamento são apontadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como essenciais para proteção à disseminação desenfreada do coronavírus. A população quilombola também não consta como destinatária de políticas públicas específicas no Plano Plurianual (PPA) 2020-2023.